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[Resenha] A neutralização do adventismo
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23062011
[Resenha] A neutralização do adventismo
KNIGHT, George R. A visão apocalíptica e a neutralização do adventismo: estamos apagando nossa relevância? Tradução de Davidson Deane; Karina Carnassale Deana. Tatuí, SP: CPB, 2010.
por Milton L. Torres, PhD
O fato de George Knight escrever livros provocantes e historicamente precisos já não nos surpreende. Esse pensador adventista tem um pendor natural para a leitura das épocas e a interpretação dos tempos, especialmente no que diz respeito ao percurso dos adventistas do sétimo dia. No caso deste livro, o próprio título já traz consigo uma ambiguidade instigante: a neutralização do adventismo pode ser sua “castração”, um impedimento à sua reprodução ou crescimento.
O capítulo 1 (“O cordeiro e o leão”, p. 7-28) procura responder a pergunta: “por que ser adventista?” Ao refletir sobre o significado do adventismo, Knight chega à conclusão de que “há certo nível de conforto em ´brincar de igreja´” (p. 9). Para ele, “se o adventismo perder sua visão apocalíptica, perderá a razão de sua existência como igreja e como sistema educacional” (p. 11). Os adventistas podem ser adventistas adventistas (exclusivamente preocupados com as questiúnculas doutrinárias de sua denominação), cristãos cristãos (esforçando-se para serem vistos como mais uma denominação evangélica) e adventistas cristãos (fiéis à sua herança adventista e, ainda assim, felizes por sua herança evangélica). É a pertinência ao terceiro grupo que Knight recomenda. Como “Jesus de Nazaré não foi politicamente correto em Suas declarações” (p. 14), o autor tem dificuldades em compreender o esforço de muitos adventistas para serem culturalmente compatíveis com a época em que vivem. Ele lamenta que tenhamos perdido “a arrogância santificada que, no passado, nos levou a crer que possuíamos uma mensagem que o mundo inteiro tinha que ouvir” (p. 16). Por isso, Knight compara os adventistas ao colportor Walter Harper que, para se livrar das tentações sexuais, praticou a autocastração. O autor nos lembra que “as pessoas estão em busca de uma igreja que esteja acima da cultura, que seja arrogante o suficiente para crer que há erro e verdade, e que ela possui a verdade” (p. 20). Segundo ele, “o atalho para a irrelevância é a mera relevância” (p. 20). Afirma, ainda, que há três maneiras de a igreja adventista praticar a autocastração: dando ênfase às bestas do Apocalipse, deixando de pregar a mensagem do Cordeiro e menosprezando a questão da ira de Deus. Os adventistas não podem menosprezar nem o medo e nem o pecado, pois “o Apocalipse é o julgamento da mentalidade pós-moderna” (p. 27).
O capítulo 2 (“A visão apocalíptica, p. 29-52) abre com a declaração de que “se temos apenas o Cordeiro, possuímos apenas metade do evangelho. Obviamente, se temos apenas as bestas, não há evangelho nenhum” (p. 29). Este capítulo apresenta o cenário profético dos livros de Daniel e Apocalipse, bem como o papel de Guilherme Miller no surgimento do movimento adventista. Para o autor, “22 de outubro foi, na verdade, o dia da grande expectativa” (p. 38) e não o dia do grande desapontamento. Graças àquela experiência, os adventistas desenvolveram a doutrina do santuário celestial (por meio de O. R. L. Crosier, G. W. Peavey e E. C. Clemens), compreenderam a verdade sobre a guarda do sábado (com J. Bates), entenderam a dinâmica do grande conflito (com J. Bates e E. G. White) e aceitaram a comissão de pregar as três mensagens angélicas (com J. Bates). Knight aproveita a oportunidade para esclarecer que “Bates desenvolveu a teologia do grande conflito com base na Palavra de Deus, sem o benefício do dom profético de Ellen White” (p. 45). A seguir, o autor trata do importante debate de 1888, considerando-o o resultado do espírito belicoso que se desenvolveu por causa do método excessivamente apologético adotado nos primeiros 40 anos da história da igreja. De um lado, havia a posição legalista de T. White e J. N. Andrews; do outro, a interpretação com ênfase na justificação, proposta por A. T. Jones e E. J. Waggoner. A divergência só foi resolvida após o pronunciamento de E. White, causando uma espécie de rebatismo da igreja adventista (p. 48). Focados em Ap 14:12, os adventistas montaram o quebra-cabeças: a espera de Jesus pressupõe a guarda dos mandamentos e o desenvolvimento de um relacionamento pessoal com Jesus.
Na abertura do capítulo 3 (“A relevância do adventismo”, p. 53-81), Knight declara que “a maioria das batalhas teológicas é travada entre os ramos e as folhas” da árvore teológica. O autor está assim se preparando para desferir seus golpes contra os pregadores adventistas que querem, de alguma forma, alterar o teor da mensagem adventista a fim de torná-la mais relevante e, portanto, mais palatável aos ouvintes. Para ele, “a maior ameaça ao adventismo atual é perder sua compreensão da visão apocalíptica responsável por nos tornar um povo singular e vital” (p. 55). Segundo ele, não podemos nos esquecer das bestas por duas razões: (i) a Bíblia está cheia delas e (ii) o mundo está cheio delas. O pior é que “a jornada espiritual é como engatinhar num funil do fim para o início” (p. 60). Além disso, infelizmente, corremos o risco de ser lamentavelmente arrogantes (a ponto de nos considerar os donos da verdade) ou de ser elegantes demais (para afirmar qualquer coisa além de nossas dúvidas), pois “a Igreja Adventista hoje possui os ministros e membros leigos mais cultos e instruídos de sua história” (p. 60). Para Knight, porém, “o adventismo tem apenas um problema teológico real: Jesus ainda não voltou” (p. 60). Dito isso, o autor salta para uma breve apresentação dos diferentes sistemas de interpretação profética: o preterismo (defendido pela maioria dos teólogos), o historicismo adventista (dependente do princípio de que um dia profético equivale a um ano cronológico e, às vezes, acusado de eurocêntrico) e o futurismo (com a incoerente interpretação de que a purificação do templo, em Daniel, é um evento passado). A seguir, Knight aborda a questão das quatro doutrinas adventistas consideradas polêmicas pelos não adventistas e por um número crescente de teólogos adventistas: (i) o juízo investigativo; (ii) o santuário celestial; (iii) o grande conflito e (iv) o remanescente. Falando do juízo investigativo, uma de nossas doutrinas mais contestadas pelos próprios teólogos adventistas, chega à conclusão de que o problema não está com a fundamentação bíblica dessa doutrina, mas na forma intimidadora como ela tem sido apresentada por nossos pregadores. Falando do santuário celestial, reconhece quatro defeitos da pregação adventista sobre essa doutrina: (i) nossa atenção excessiva aos detalhes; (ii) nossa reversão de polaridades, fazendo com que o santuário celestial se torne o reflexo do terrestre; (iii) nossa negligência da dimensão alegórica (grego parabolê) do santuário; e (iv) a “adventização” do livro de Hebreus. Sua opinião é de que “estamos, sem dúvida, sobre terreno sólido no que diz respeito à nossa doutrina do santuário, mas não com relação à maneira como alguns a ensinam” (p. 77). Ao tratar do tema do grande conflito, apresenta as duas certezas adventistas sobre o assunto: (i) o dia não é a questão central (mas a lealdade e a adoração) e (ii) essa doutrina encontra-se fundamentada na Bíblia e não (apenas) em E. White. Finalmente, em relação ao remanescente, Knight reconhece que a igreja adventista não é perfeita, mas é a mais próxima da verdade bíblica que conhece.
O capítulo 4 (“Cenário de crise”, p. 82-91) abre com as evidências de que nossa época está experimentando uma descontinuidade radical: (i) a queda do muro de Berlim; (ii) a decadência do comunismo; (iii) o ataque terrorista a Nova Iorque; e (iv) a ascensão da China. Para o autor, há três indícios de que estamos perto da consumação escatológica: (i) a implantação de “uma ética de naufrágio”, segundo a qual, “se comermos juntos hoje, todos passaremos fome amanhã” (p. 84); (ii) as três correções do clube de Roma (de que os direitos humanos não são apenas relativos às liberdades individuais, de que os direitos humanos são uma questão política, e de que os padrões dos direitos humanos não se aplicam apenas aos outros; e (iii) as manchetes de jornais (que apontam para novos estilos de guerra e um estado de inquietação geral). Depois de sugerir três de seus livros favoritos sobre escatologia, Knight propõe a tese de Michael Barkum de que o pensamento direto chegou ao fim, pois as crises causam mudanças rápidas. De acordo com a metáfora de Sherlock Holmes, roubaram a barraca adventista e nós continuamos deitados, contemplando as estrelas! O autor conclui este curto capítulo relembrando a visão de um caminho reto, estreito e iluminado, que E. White registrou em Primeiros escritos: quando rejeitamos uma luz, ela é tirada de nós. Ao tratar dos temas da fome mundial e da violação dos direitos individuais em nome da coletividade, Knight prepara o terreno para abordar a questão que realmente o incomoda: o fato de que alguns pregadores adventistas estão mudando o teor da mensagem adventista para que esta se enquadre nas expectativas pós-modernas de um evangelho social e tolerante às diferenças. Isso ele fará no capítulo 5.
O capítulo 5 (“Expectativa equilibrada”, p. 92-104) é o menos original do livro. O capítulo repete vários dos argumentos apresentados por Steve Daily, em seu livro Adventism for a new generation (“Adventismo para uma nova geração”). Aliás, parece que o objetivo (nunca declarado) de Knight é justamente prover uma resposta àquele livro (publicado em 1992). Knight já afirmara, no capítulo 3, que o sábado não é a questão central dos últimos dias (mas a lealdade e a adoração), uma frase literalmente tirada do livro de Daily (p. 172). Agora, faz uma análise muito semelhante à de Daily com respeito às parábolas escatológicas situadas perto de Mt 24. No entanto, suas conclusões não são as mesmas. Enquanto Daily defende que a igreja adventista precisa se envolver mais com o evangelho social (p. 317-323), para Knight, existem, no Novo Testamento, dois textos apocalípticos de interesse especial para os adventistas: Mt 24 (e capítulos correspondentes nos demais evangelhos sinóticos) e o livro de Apocalipse. No primeiro caso, há uma ênfase social (cuidar do próximo); no segundo, uma ênfase proclamatória (anunciar as três mensagens angélicas). Para Knight, a busca de relevância tem levado certos pregadores adventistas (presumivelmente Daily) a enfatizar o apocalipse social (sinótico) em detrimento do apocalipse escatológico. A partir daí, Knight retoma seu fio original de pensamento, apresentando três razões por que a igreja adventista não pode se envolver excessivamente com um evangelho social: (i) Jesus recusou o assistencialismo como base de sua pregação; (ii) foi o próprio Jesus que comissionou a pregação das três mensagens angélicas; e (iii) E. White explicitamente orientou a igreja que não sucumbisse à prática de um evangelismo essencialmente social. Infelizmente, Knight só apresenta a citação do manuscrito 3 (1889), o que não nos permite avaliar, conclusivamente, o peso do pensamento de E. White sobre o assunto. As conclusões de Knight são (i) que os dois apocalipses são complementares e não excludentes (p. 102); (ii) que a única solução para a fome e outros problemas do mundo é a volta de Jesus; e (iii) que nossa pregação precisa prescindir da ênfase no temor do tempo do fim.
O capítulo 6 (“A esperança do mundo”, p. 105-108) é lamentavelmente curto, quase que apenas “um prefácio tardio”, como o próprio autor reconhece. Esperava-se que, depois de nos mostrar em que estamos errando em nossa pregação escatológica, o autor nos pudesse dar sugestões específicas de como melhorá-la. Ele se limita, porém, a propor que a visão neoapocalíptica (i) seja uma mensagem de esperança; (ii) não seja alarmista; (iii) tenha por foco o futuro; e (iv) enalteça a perspectiva (ou herança) adventista. Resta-nos descobrir, por nós mesmos, como conseguir implementar essas recomendações, na prática, em nossos púlpitos. O livro é, sem dúvida, uma contribuição importante para o aspecto proclamatório da escatologia adventista. O ideal, como o próprio autor reconhece, é lançar mão das duas perspectivas: precisamos pregar que o fim se aproxima e, enquanto fazemos isso, precisamos cuidar daqueles que padecem neste mundo provisório.
BARKUM, Michael. Disasters and the millennium. New Haven: Yale University Press, 1974.
DAILY, Steve. Adventism for a new generation. Portland: Better Living, 1992.
WHITE, Ellen G. Primeiros escritos. Tatuí, SP; CPB, 2007.
Fonte: Resenha de A neutralização do adventismo
Categoria: | Livros |
Gênero: | Religião e Espiritualidade |
Autor: | George Knight |
O fato de George Knight escrever livros provocantes e historicamente precisos já não nos surpreende. Esse pensador adventista tem um pendor natural para a leitura das épocas e a interpretação dos tempos, especialmente no que diz respeito ao percurso dos adventistas do sétimo dia. No caso deste livro, o próprio título já traz consigo uma ambiguidade instigante: a neutralização do adventismo pode ser sua “castração”, um impedimento à sua reprodução ou crescimento.
O capítulo 1 (“O cordeiro e o leão”, p. 7-28) procura responder a pergunta: “por que ser adventista?” Ao refletir sobre o significado do adventismo, Knight chega à conclusão de que “há certo nível de conforto em ´brincar de igreja´” (p. 9). Para ele, “se o adventismo perder sua visão apocalíptica, perderá a razão de sua existência como igreja e como sistema educacional” (p. 11). Os adventistas podem ser adventistas adventistas (exclusivamente preocupados com as questiúnculas doutrinárias de sua denominação), cristãos cristãos (esforçando-se para serem vistos como mais uma denominação evangélica) e adventistas cristãos (fiéis à sua herança adventista e, ainda assim, felizes por sua herança evangélica). É a pertinência ao terceiro grupo que Knight recomenda. Como “Jesus de Nazaré não foi politicamente correto em Suas declarações” (p. 14), o autor tem dificuldades em compreender o esforço de muitos adventistas para serem culturalmente compatíveis com a época em que vivem. Ele lamenta que tenhamos perdido “a arrogância santificada que, no passado, nos levou a crer que possuíamos uma mensagem que o mundo inteiro tinha que ouvir” (p. 16). Por isso, Knight compara os adventistas ao colportor Walter Harper que, para se livrar das tentações sexuais, praticou a autocastração. O autor nos lembra que “as pessoas estão em busca de uma igreja que esteja acima da cultura, que seja arrogante o suficiente para crer que há erro e verdade, e que ela possui a verdade” (p. 20). Segundo ele, “o atalho para a irrelevância é a mera relevância” (p. 20). Afirma, ainda, que há três maneiras de a igreja adventista praticar a autocastração: dando ênfase às bestas do Apocalipse, deixando de pregar a mensagem do Cordeiro e menosprezando a questão da ira de Deus. Os adventistas não podem menosprezar nem o medo e nem o pecado, pois “o Apocalipse é o julgamento da mentalidade pós-moderna” (p. 27).
O capítulo 2 (“A visão apocalíptica, p. 29-52) abre com a declaração de que “se temos apenas o Cordeiro, possuímos apenas metade do evangelho. Obviamente, se temos apenas as bestas, não há evangelho nenhum” (p. 29). Este capítulo apresenta o cenário profético dos livros de Daniel e Apocalipse, bem como o papel de Guilherme Miller no surgimento do movimento adventista. Para o autor, “22 de outubro foi, na verdade, o dia da grande expectativa” (p. 38) e não o dia do grande desapontamento. Graças àquela experiência, os adventistas desenvolveram a doutrina do santuário celestial (por meio de O. R. L. Crosier, G. W. Peavey e E. C. Clemens), compreenderam a verdade sobre a guarda do sábado (com J. Bates), entenderam a dinâmica do grande conflito (com J. Bates e E. G. White) e aceitaram a comissão de pregar as três mensagens angélicas (com J. Bates). Knight aproveita a oportunidade para esclarecer que “Bates desenvolveu a teologia do grande conflito com base na Palavra de Deus, sem o benefício do dom profético de Ellen White” (p. 45). A seguir, o autor trata do importante debate de 1888, considerando-o o resultado do espírito belicoso que se desenvolveu por causa do método excessivamente apologético adotado nos primeiros 40 anos da história da igreja. De um lado, havia a posição legalista de T. White e J. N. Andrews; do outro, a interpretação com ênfase na justificação, proposta por A. T. Jones e E. J. Waggoner. A divergência só foi resolvida após o pronunciamento de E. White, causando uma espécie de rebatismo da igreja adventista (p. 48). Focados em Ap 14:12, os adventistas montaram o quebra-cabeças: a espera de Jesus pressupõe a guarda dos mandamentos e o desenvolvimento de um relacionamento pessoal com Jesus.
Na abertura do capítulo 3 (“A relevância do adventismo”, p. 53-81), Knight declara que “a maioria das batalhas teológicas é travada entre os ramos e as folhas” da árvore teológica. O autor está assim se preparando para desferir seus golpes contra os pregadores adventistas que querem, de alguma forma, alterar o teor da mensagem adventista a fim de torná-la mais relevante e, portanto, mais palatável aos ouvintes. Para ele, “a maior ameaça ao adventismo atual é perder sua compreensão da visão apocalíptica responsável por nos tornar um povo singular e vital” (p. 55). Segundo ele, não podemos nos esquecer das bestas por duas razões: (i) a Bíblia está cheia delas e (ii) o mundo está cheio delas. O pior é que “a jornada espiritual é como engatinhar num funil do fim para o início” (p. 60). Além disso, infelizmente, corremos o risco de ser lamentavelmente arrogantes (a ponto de nos considerar os donos da verdade) ou de ser elegantes demais (para afirmar qualquer coisa além de nossas dúvidas), pois “a Igreja Adventista hoje possui os ministros e membros leigos mais cultos e instruídos de sua história” (p. 60). Para Knight, porém, “o adventismo tem apenas um problema teológico real: Jesus ainda não voltou” (p. 60). Dito isso, o autor salta para uma breve apresentação dos diferentes sistemas de interpretação profética: o preterismo (defendido pela maioria dos teólogos), o historicismo adventista (dependente do princípio de que um dia profético equivale a um ano cronológico e, às vezes, acusado de eurocêntrico) e o futurismo (com a incoerente interpretação de que a purificação do templo, em Daniel, é um evento passado). A seguir, Knight aborda a questão das quatro doutrinas adventistas consideradas polêmicas pelos não adventistas e por um número crescente de teólogos adventistas: (i) o juízo investigativo; (ii) o santuário celestial; (iii) o grande conflito e (iv) o remanescente. Falando do juízo investigativo, uma de nossas doutrinas mais contestadas pelos próprios teólogos adventistas, chega à conclusão de que o problema não está com a fundamentação bíblica dessa doutrina, mas na forma intimidadora como ela tem sido apresentada por nossos pregadores. Falando do santuário celestial, reconhece quatro defeitos da pregação adventista sobre essa doutrina: (i) nossa atenção excessiva aos detalhes; (ii) nossa reversão de polaridades, fazendo com que o santuário celestial se torne o reflexo do terrestre; (iii) nossa negligência da dimensão alegórica (grego parabolê) do santuário; e (iv) a “adventização” do livro de Hebreus. Sua opinião é de que “estamos, sem dúvida, sobre terreno sólido no que diz respeito à nossa doutrina do santuário, mas não com relação à maneira como alguns a ensinam” (p. 77). Ao tratar do tema do grande conflito, apresenta as duas certezas adventistas sobre o assunto: (i) o dia não é a questão central (mas a lealdade e a adoração) e (ii) essa doutrina encontra-se fundamentada na Bíblia e não (apenas) em E. White. Finalmente, em relação ao remanescente, Knight reconhece que a igreja adventista não é perfeita, mas é a mais próxima da verdade bíblica que conhece.
O capítulo 4 (“Cenário de crise”, p. 82-91) abre com as evidências de que nossa época está experimentando uma descontinuidade radical: (i) a queda do muro de Berlim; (ii) a decadência do comunismo; (iii) o ataque terrorista a Nova Iorque; e (iv) a ascensão da China. Para o autor, há três indícios de que estamos perto da consumação escatológica: (i) a implantação de “uma ética de naufrágio”, segundo a qual, “se comermos juntos hoje, todos passaremos fome amanhã” (p. 84); (ii) as três correções do clube de Roma (de que os direitos humanos não são apenas relativos às liberdades individuais, de que os direitos humanos são uma questão política, e de que os padrões dos direitos humanos não se aplicam apenas aos outros; e (iii) as manchetes de jornais (que apontam para novos estilos de guerra e um estado de inquietação geral). Depois de sugerir três de seus livros favoritos sobre escatologia, Knight propõe a tese de Michael Barkum de que o pensamento direto chegou ao fim, pois as crises causam mudanças rápidas. De acordo com a metáfora de Sherlock Holmes, roubaram a barraca adventista e nós continuamos deitados, contemplando as estrelas! O autor conclui este curto capítulo relembrando a visão de um caminho reto, estreito e iluminado, que E. White registrou em Primeiros escritos: quando rejeitamos uma luz, ela é tirada de nós. Ao tratar dos temas da fome mundial e da violação dos direitos individuais em nome da coletividade, Knight prepara o terreno para abordar a questão que realmente o incomoda: o fato de que alguns pregadores adventistas estão mudando o teor da mensagem adventista para que esta se enquadre nas expectativas pós-modernas de um evangelho social e tolerante às diferenças. Isso ele fará no capítulo 5.
O capítulo 5 (“Expectativa equilibrada”, p. 92-104) é o menos original do livro. O capítulo repete vários dos argumentos apresentados por Steve Daily, em seu livro Adventism for a new generation (“Adventismo para uma nova geração”). Aliás, parece que o objetivo (nunca declarado) de Knight é justamente prover uma resposta àquele livro (publicado em 1992). Knight já afirmara, no capítulo 3, que o sábado não é a questão central dos últimos dias (mas a lealdade e a adoração), uma frase literalmente tirada do livro de Daily (p. 172). Agora, faz uma análise muito semelhante à de Daily com respeito às parábolas escatológicas situadas perto de Mt 24. No entanto, suas conclusões não são as mesmas. Enquanto Daily defende que a igreja adventista precisa se envolver mais com o evangelho social (p. 317-323), para Knight, existem, no Novo Testamento, dois textos apocalípticos de interesse especial para os adventistas: Mt 24 (e capítulos correspondentes nos demais evangelhos sinóticos) e o livro de Apocalipse. No primeiro caso, há uma ênfase social (cuidar do próximo); no segundo, uma ênfase proclamatória (anunciar as três mensagens angélicas). Para Knight, a busca de relevância tem levado certos pregadores adventistas (presumivelmente Daily) a enfatizar o apocalipse social (sinótico) em detrimento do apocalipse escatológico. A partir daí, Knight retoma seu fio original de pensamento, apresentando três razões por que a igreja adventista não pode se envolver excessivamente com um evangelho social: (i) Jesus recusou o assistencialismo como base de sua pregação; (ii) foi o próprio Jesus que comissionou a pregação das três mensagens angélicas; e (iii) E. White explicitamente orientou a igreja que não sucumbisse à prática de um evangelismo essencialmente social. Infelizmente, Knight só apresenta a citação do manuscrito 3 (1889), o que não nos permite avaliar, conclusivamente, o peso do pensamento de E. White sobre o assunto. As conclusões de Knight são (i) que os dois apocalipses são complementares e não excludentes (p. 102); (ii) que a única solução para a fome e outros problemas do mundo é a volta de Jesus; e (iii) que nossa pregação precisa prescindir da ênfase no temor do tempo do fim.
O capítulo 6 (“A esperança do mundo”, p. 105-108) é lamentavelmente curto, quase que apenas “um prefácio tardio”, como o próprio autor reconhece. Esperava-se que, depois de nos mostrar em que estamos errando em nossa pregação escatológica, o autor nos pudesse dar sugestões específicas de como melhorá-la. Ele se limita, porém, a propor que a visão neoapocalíptica (i) seja uma mensagem de esperança; (ii) não seja alarmista; (iii) tenha por foco o futuro; e (iv) enalteça a perspectiva (ou herança) adventista. Resta-nos descobrir, por nós mesmos, como conseguir implementar essas recomendações, na prática, em nossos púlpitos. O livro é, sem dúvida, uma contribuição importante para o aspecto proclamatório da escatologia adventista. O ideal, como o próprio autor reconhece, é lançar mão das duas perspectivas: precisamos pregar que o fim se aproxima e, enquanto fazemos isso, precisamos cuidar daqueles que padecem neste mundo provisório.
BARKUM, Michael. Disasters and the millennium. New Haven: Yale University Press, 1974.
DAILY, Steve. Adventism for a new generation. Portland: Better Living, 1992.
WHITE, Ellen G. Primeiros escritos. Tatuí, SP; CPB, 2007.
Fonte: Resenha de A neutralização do adventismo
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Inscrição : 08/05/2010
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