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A Bíblia preconiza o vegetarianismo
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02092011
A Bíblia preconiza o vegetarianismo
Sejamos judeus, cristãos ou muçulmanos, a fonte de nossa inspiração religiosa é a Bíblia. Mesmo os muçulmanos, que adotam outro livro sagrado, reconhecem a Bíblia como cânone. Ateus e agnósticos, embora não creiam diretamente em textos sagrados, são influenciados por estes visto que estão inseridos em sociedades que foram moldadas utilizando-os como inspiração. Vivemos em sociedades laicas, mas a religião, ainda que não praticada, influencia o pensamento e, em parte, o comportamento.
A costumeira justificativa religiosa para o especismo é baseada numa breve passagem bíblica que explicaria nossa natureza semi-divina e nosso direito sobre as demais espécies. Em Gênesis 1:26, está escrito: “Também disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra.”.
No entanto, a Bíblia é um livro complexo e permite múltiplas interpretações, além de versões e traduções.
Se verificarmos o original em hebraico, veremos que o que tem sido traduzido como “ter domínio” é a palavra “yirdu”. “Yirdu” poderia ser melhor traduzido como “descerão”. Fosse a intenção do autor do original hebraico de fato transmitir a idéia de domínio na criação, a palavra que deveria ser empregada seria “shalthanhon”. Nem mesmo a idéia de governo benévolo do homem sobre as demais criaturas é passada neste versículo, visto que a palavra que a Bíblia usa quando se refere ao domínio pacífico é “mashel”.
Porém, o que vemos é que foi empregada a palavra ” yirdu”, que permite uma outra tradução do versículo: “Disse Deus: façamos o homem à nossa imagem e semelhança; e descerão para os peixes do mar, e para as aves dos céus, para os rebanhos e para toda a terra e para todo réptil que rasteja sobre a terra”. Se seguirmos essa tradução, que é mais fiel ao original, podemos interpretar que a intenção da Bíblia pode ter sido mostrar que Deus criou o homem de uma maneira especial, mas que o homem desceria (ou seja, seria igualado) para a condição de um animal.
Mesmo a continuação do livro parece apoiar esta idéia. Em Gênesis 1:28, costumamos ver o versículo traduzido desta forma: “E Deus os abençoou e lhes disse: sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra.”. Novamente, a palavra “desça” aparece traduzida como “domine”. O que aparece nesse versículo como “sujeitai-a” é a palavra “kibshah”, que significa preservar. Fosse de fato a intenção do autor transmitir a idéia de “sujeitar” ele teria empregado a palavra “hichriach”.
A tradução literal deste versículo seria: “E abençoou-os Deus e lhes disse Deus: fecundem-se, tornem-se muitos, encham a terra e preservem-na; e desçam para (a condição dos) peixes do mar, e para as aves dos céus e para todo animal que rasteja sobre a terra”.
Esta idéia de que homens e animais estão em pé de igualdade perante Deus encontra-se em Eclesiastes 3:18-21: “Disse ainda comigo: é por causa dos filhos dos homens, para que Deus os prove, e eles vejam que são em si mesmos como os animais. Porque o que sucede aos filhos dos homens sucede aos animais; o mesmo lhes sucede: como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade. Todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tornarão. Quem sabe se o fôlego de vida dos filhos dos homens se dirige para cima e o dos animais para baixo, para a terra?”
A intenção aqui não é, porém, estender-me em uma tradução revisionista de todo o texto bíblico, mas sim demonstrar que erros de tradução levam a erros de interpretação. Já foi demonstrado muitas vezes que a Bíblia pode ser utilizada para defender qualquer idéia. Pela tradução tendenciosa do versículo de Gênesis 1:26, nasceu toda a concepção de que o homem é um ser semi-divino e tem o direito de sujeitar ao seu domínio todos os demais seres da criação, sujeitar a Terra. Mas e se a intenção do autor tivesse sido outra?
Gênesis 1:29 e 1:30 apresentam a primeira lei dietética estabelecida por Deus para o homem e para os outros animais “E disse Deus: Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão sementes e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há frutos que dão sementes; isso vos será por alimento. E a todos os animais da terra, e a todas as aves dos céus, e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhes será para mantimento. E assim se fez.”.
Esses versículos demonstram que não era a intenção original de Deus, pelo menos segundo o livro de Gênesis, que o homem matasse animais para comer. A dieta vegana era a consistente com o plano original de Deus. Apesar disso, quantas pessoas não lêem esses versículos diariamente e deixam de refletir sobre seu significado?
O Talmud, coleção de comentários e compilações da tradição oral judaica, reforça a idéia bíblica de que, se no princípio o homem não comia carne, era porque a intenção original de Deus era que este e os demais animais fossem vegetarianos. De fato, escreveram sobre esse assunto muitos comentadores bíblicos, entre eles Rashi (1040-1105), Abraham Ibn Ezra (1092-1167), Maimônides (1135-1214), Nachmanides (1194-1270) e Rabi Joseph Albo (séc. XV).
A Bíblia conta (Gen. 2:8) que quando Deus criou o homem, colocou-o para habitar no Jardim do Éden. Nesse jardim, foi ordenado que o homem se servisse dos frutos de toda árvore (Gen. 2:16), exceto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gen. 2:17). Devido ao pecado original, o homem foi expulso do jardim e recebeu também a permissão para comer as ervas do campo (Gen. 3:18). Poderia-se até dizer que a Biblia sugere que Deus criou o homem frutariano, e depois o fez vegano.
Conforme a genealogia apresentada em Gênesis 5, entre Adão e Noé passaram-se dez gerações. Segundo a Bíblia, nos tempos de Noé, Deus resolveu destruir tudo com um dilúvio, porque toda a criação havia se corrompido. Noé encarregou-se de construir uma arca e salvar sua família e alguns exemplares de cada espécie animal. Conta a Bíblia que, quando as águas baixaram, seres humanos e demais animais saíram e constataram que a terra estava seca.
Podemos, porém, imaginar que, após mais de um ano submersa, já não havia sobre a terra vegetação suficiente para sustentar a todos. Foram Noé e seus filhos, segundo a Bíblia, os primeiros seres humanos que comeram carne.
Toda a harmonia que havia prevalecido entre os homens e demais animais no paraíso, após a expulsão e durante o período do dilúvio, segundo a Bíblia, deixou de existir. “Pavor e medo de vós virão sobre todos os animais da terra e sobre todas as aves dos céus; tudo o que se move sobre a terra e todos os peixes do mar nas vossas mãos serão entregues.” (Gen. 9:2).
Naquele momento, passaram a existir animais herbívoros e carnívoros, e o homem tornou-se onívoro:“Tudo o que se move e vive ser-vos-á para alimento; como vos dei a erva verde, tudo vos dou agora.” (Gen. 9:3). A frase “como vos dei a erva verde” reforça que até então eles só tinham autorização para serem veganos. Seria, porém, esta concessão pontual motivo para justificar que comessemos carne até os dias de hoje?
Segundo Rav Kook, primeiro grão-rabino de Israel, não podemos ver essa permissão para comer carne, dada a Noé em uma situação específica, como uma concessão a toda a humanidade posterior. Em sua interpretação, estava claro que se tratava de uma permissão efêmera, até que a terra voltasse a produzir o alimento. A situação em que Noé se coloca é a de um homem perdido em uma ilha deserta, sem muitos recursos à disposição.
O período das dez primeiras gerações descrito em Gênesis foi, portanto, de pessoas vegetarianas, e a Bíblia mostra que o homem só começou a consumir carne quando condições ambientais o forçaram a tal.
Há um segundo período segundo o qual o autor da Bíblia mostra que Deus pretendia tornar o homem novamente vegetariano. As escrituras contam que, quando os israelitas saíram do Egito, o plano de Deus era que aquele povo recém-liberto da escravidão vagasse pelo deserto pelo tempo necessário para que se purificasse. Foi lhes dado um alimento que caia do céu, que era “como semente de coentro, branco e de sabor como bolos de mel” (Êxodo 16:31, Números 11:7).
Esse alimento, simples, mas completo nutricionalmente, deveria sustentá-los pelo tempo que permanecessem no deserto (40 anos), pois em Êxodos 16:35 está escrito “E comeram os filhos de Israel manah quarenta anos, até que entraram em terra habitada; comeram manah até que chegaram aos limites da terra de Canaã.”.
No entanto, durante a travessia do deserto, alguns incidentes ocorreram. As pessoas começaram a reclamar de sua dieta puramente vegetariana: “Agora, porém, seca-se a nossa alma, e nenhuma coisa vemos senão este manah” (Num 11:6). Por outro lado, pediam novamente pelos alimentos que consumiam no Egito – carne e peixes, entre outros (Num. 11:4-5).
A contra gosto, Deus atendeu às reclamações, providenciando carne sob a forma de codornizes, que foram sopradas pelo ventos dos mares. Porém, logo depois, Deus puniu aquelas pessoas, por não aceitarem de bom grado o alimento perfeito que Ele lhes oferecia: “Estando ainda a carne entre os seus dentes, antes que fosse mastigada, quando a ira do Senhor se acendeu contra o povo, e o feriu com grande praga.” (Num. 11:33).
O lugar onde ocorreu esse incidente foi batizado de “Kivrot Hataava”, que em português significa Tumbas da Luxúria, porque foi o desejo de luxo daquele povo, e não sua necessidade, o que os levou à morte (Num. 11:34).
Essa passagem referente ao manah traz uma idéia de que poucos se dão conta: o alimento que nos é destinado é bastante simples, pode ser encontrado em abundância e nos mantém saudáveis. Por outro lado, quando buscamos alimentos que não nos são apropriados, perecemos.
Atualmente sabe-se, por diversas passagens, que a Bíblia permite o consumo de carne. No entanto, esse consumo se dá mais na base da concessão do que de uma recomendação, como se Deus dissesse: “O ideal é que o homem não coma carne, mas já que ele quer…”.
Por isso, a Bíblia estabelece alguns impedimentos que, em conjunto, são chamados de leis relativas à kashrut: a carne deve estar completamente livre de sangue (Levítico 17:10-14, 19:26; e Deuteronômio 12:16, 12:23, 15:23), somente podem ser consumidos animais considerados puros (Levítico 11), e o abate de um animal deve obedecer a um determinado ritual (Levítico 17:4).
As escrituras relacionadas refletem a observância escrupulosa de muitas regras, mas tão somente no que se refere ao consumo de produtos de origem animal. As únicas condições impostas ao consumo de alimentos de origem vegetal é que estes estejam limpos, o que é facilmente compreensível, do ponto de vista sanitário.
Qual a mensagem da Bíblia, com todas essas proibições ao consumo de alimentos de origem animal? Tornar esse consumo mais refletido, duro, impraticável. É quase impossível cumprir com todas as regras impostas pela Bíblia para o consumo de carne
Justamente nisso está a graça. Com tantas regras, Deus parece de novo estar dizendo “O homem não deve comer carne”.Quando a Bíblia faz referência à generosidade divina (Deut. 8: 7-10; Deut. 11:14; Salmos 72:16, Amos 9:14-15; Jer. 29:5; Isaías 65:21), os produtos mais freqüentemente citados são os frutos, vegetais, sementes, vinho e pão, mas jamais as carnes.
Tal qual no Jardim do Éden, em que nem o homem nem os animais comiam carne, a promessa bíblica é a de que, com a vinda do Messias, novamente o mundo se tornará vegetariano. “O lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o filhote do leão e o animal doméstico andarão juntos, e um condutor pequeno os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as suas crias juntas se deitarão; o leão como o boi comerá palha. A criança de peito brincará sobre a toca da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco.” (Isaías 11: 6-8). Continua Isaías (65:25): “O lobo e o cordeiro pastarão juntos, e o leão comerá palha como o boi; pó será a comida da serpente. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, diz o SENHOR”.
FONTE
A costumeira justificativa religiosa para o especismo é baseada numa breve passagem bíblica que explicaria nossa natureza semi-divina e nosso direito sobre as demais espécies. Em Gênesis 1:26, está escrito: “Também disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra.”.
No entanto, a Bíblia é um livro complexo e permite múltiplas interpretações, além de versões e traduções.
Se verificarmos o original em hebraico, veremos que o que tem sido traduzido como “ter domínio” é a palavra “yirdu”. “Yirdu” poderia ser melhor traduzido como “descerão”. Fosse a intenção do autor do original hebraico de fato transmitir a idéia de domínio na criação, a palavra que deveria ser empregada seria “shalthanhon”. Nem mesmo a idéia de governo benévolo do homem sobre as demais criaturas é passada neste versículo, visto que a palavra que a Bíblia usa quando se refere ao domínio pacífico é “mashel”.
Porém, o que vemos é que foi empregada a palavra ” yirdu”, que permite uma outra tradução do versículo: “Disse Deus: façamos o homem à nossa imagem e semelhança; e descerão para os peixes do mar, e para as aves dos céus, para os rebanhos e para toda a terra e para todo réptil que rasteja sobre a terra”. Se seguirmos essa tradução, que é mais fiel ao original, podemos interpretar que a intenção da Bíblia pode ter sido mostrar que Deus criou o homem de uma maneira especial, mas que o homem desceria (ou seja, seria igualado) para a condição de um animal.
Mesmo a continuação do livro parece apoiar esta idéia. Em Gênesis 1:28, costumamos ver o versículo traduzido desta forma: “E Deus os abençoou e lhes disse: sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra.”. Novamente, a palavra “desça” aparece traduzida como “domine”. O que aparece nesse versículo como “sujeitai-a” é a palavra “kibshah”, que significa preservar. Fosse de fato a intenção do autor transmitir a idéia de “sujeitar” ele teria empregado a palavra “hichriach”.
A tradução literal deste versículo seria: “E abençoou-os Deus e lhes disse Deus: fecundem-se, tornem-se muitos, encham a terra e preservem-na; e desçam para (a condição dos) peixes do mar, e para as aves dos céus e para todo animal que rasteja sobre a terra”.
Esta idéia de que homens e animais estão em pé de igualdade perante Deus encontra-se em Eclesiastes 3:18-21: “Disse ainda comigo: é por causa dos filhos dos homens, para que Deus os prove, e eles vejam que são em si mesmos como os animais. Porque o que sucede aos filhos dos homens sucede aos animais; o mesmo lhes sucede: como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade. Todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tornarão. Quem sabe se o fôlego de vida dos filhos dos homens se dirige para cima e o dos animais para baixo, para a terra?”
A intenção aqui não é, porém, estender-me em uma tradução revisionista de todo o texto bíblico, mas sim demonstrar que erros de tradução levam a erros de interpretação. Já foi demonstrado muitas vezes que a Bíblia pode ser utilizada para defender qualquer idéia. Pela tradução tendenciosa do versículo de Gênesis 1:26, nasceu toda a concepção de que o homem é um ser semi-divino e tem o direito de sujeitar ao seu domínio todos os demais seres da criação, sujeitar a Terra. Mas e se a intenção do autor tivesse sido outra?
Gênesis 1:29 e 1:30 apresentam a primeira lei dietética estabelecida por Deus para o homem e para os outros animais “E disse Deus: Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão sementes e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há frutos que dão sementes; isso vos será por alimento. E a todos os animais da terra, e a todas as aves dos céus, e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhes será para mantimento. E assim se fez.”.
Esses versículos demonstram que não era a intenção original de Deus, pelo menos segundo o livro de Gênesis, que o homem matasse animais para comer. A dieta vegana era a consistente com o plano original de Deus. Apesar disso, quantas pessoas não lêem esses versículos diariamente e deixam de refletir sobre seu significado?
O Talmud, coleção de comentários e compilações da tradição oral judaica, reforça a idéia bíblica de que, se no princípio o homem não comia carne, era porque a intenção original de Deus era que este e os demais animais fossem vegetarianos. De fato, escreveram sobre esse assunto muitos comentadores bíblicos, entre eles Rashi (1040-1105), Abraham Ibn Ezra (1092-1167), Maimônides (1135-1214), Nachmanides (1194-1270) e Rabi Joseph Albo (séc. XV).
A Bíblia conta (Gen. 2:8) que quando Deus criou o homem, colocou-o para habitar no Jardim do Éden. Nesse jardim, foi ordenado que o homem se servisse dos frutos de toda árvore (Gen. 2:16), exceto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gen. 2:17). Devido ao pecado original, o homem foi expulso do jardim e recebeu também a permissão para comer as ervas do campo (Gen. 3:18). Poderia-se até dizer que a Biblia sugere que Deus criou o homem frutariano, e depois o fez vegano.
Conforme a genealogia apresentada em Gênesis 5, entre Adão e Noé passaram-se dez gerações. Segundo a Bíblia, nos tempos de Noé, Deus resolveu destruir tudo com um dilúvio, porque toda a criação havia se corrompido. Noé encarregou-se de construir uma arca e salvar sua família e alguns exemplares de cada espécie animal. Conta a Bíblia que, quando as águas baixaram, seres humanos e demais animais saíram e constataram que a terra estava seca.
Podemos, porém, imaginar que, após mais de um ano submersa, já não havia sobre a terra vegetação suficiente para sustentar a todos. Foram Noé e seus filhos, segundo a Bíblia, os primeiros seres humanos que comeram carne.
Toda a harmonia que havia prevalecido entre os homens e demais animais no paraíso, após a expulsão e durante o período do dilúvio, segundo a Bíblia, deixou de existir. “Pavor e medo de vós virão sobre todos os animais da terra e sobre todas as aves dos céus; tudo o que se move sobre a terra e todos os peixes do mar nas vossas mãos serão entregues.” (Gen. 9:2).
Naquele momento, passaram a existir animais herbívoros e carnívoros, e o homem tornou-se onívoro:“Tudo o que se move e vive ser-vos-á para alimento; como vos dei a erva verde, tudo vos dou agora.” (Gen. 9:3). A frase “como vos dei a erva verde” reforça que até então eles só tinham autorização para serem veganos. Seria, porém, esta concessão pontual motivo para justificar que comessemos carne até os dias de hoje?
Segundo Rav Kook, primeiro grão-rabino de Israel, não podemos ver essa permissão para comer carne, dada a Noé em uma situação específica, como uma concessão a toda a humanidade posterior. Em sua interpretação, estava claro que se tratava de uma permissão efêmera, até que a terra voltasse a produzir o alimento. A situação em que Noé se coloca é a de um homem perdido em uma ilha deserta, sem muitos recursos à disposição.
O período das dez primeiras gerações descrito em Gênesis foi, portanto, de pessoas vegetarianas, e a Bíblia mostra que o homem só começou a consumir carne quando condições ambientais o forçaram a tal.
Há um segundo período segundo o qual o autor da Bíblia mostra que Deus pretendia tornar o homem novamente vegetariano. As escrituras contam que, quando os israelitas saíram do Egito, o plano de Deus era que aquele povo recém-liberto da escravidão vagasse pelo deserto pelo tempo necessário para que se purificasse. Foi lhes dado um alimento que caia do céu, que era “como semente de coentro, branco e de sabor como bolos de mel” (Êxodo 16:31, Números 11:7).
Esse alimento, simples, mas completo nutricionalmente, deveria sustentá-los pelo tempo que permanecessem no deserto (40 anos), pois em Êxodos 16:35 está escrito “E comeram os filhos de Israel manah quarenta anos, até que entraram em terra habitada; comeram manah até que chegaram aos limites da terra de Canaã.”.
No entanto, durante a travessia do deserto, alguns incidentes ocorreram. As pessoas começaram a reclamar de sua dieta puramente vegetariana: “Agora, porém, seca-se a nossa alma, e nenhuma coisa vemos senão este manah” (Num 11:6). Por outro lado, pediam novamente pelos alimentos que consumiam no Egito – carne e peixes, entre outros (Num. 11:4-5).
A contra gosto, Deus atendeu às reclamações, providenciando carne sob a forma de codornizes, que foram sopradas pelo ventos dos mares. Porém, logo depois, Deus puniu aquelas pessoas, por não aceitarem de bom grado o alimento perfeito que Ele lhes oferecia: “Estando ainda a carne entre os seus dentes, antes que fosse mastigada, quando a ira do Senhor se acendeu contra o povo, e o feriu com grande praga.” (Num. 11:33).
O lugar onde ocorreu esse incidente foi batizado de “Kivrot Hataava”, que em português significa Tumbas da Luxúria, porque foi o desejo de luxo daquele povo, e não sua necessidade, o que os levou à morte (Num. 11:34).
Essa passagem referente ao manah traz uma idéia de que poucos se dão conta: o alimento que nos é destinado é bastante simples, pode ser encontrado em abundância e nos mantém saudáveis. Por outro lado, quando buscamos alimentos que não nos são apropriados, perecemos.
Atualmente sabe-se, por diversas passagens, que a Bíblia permite o consumo de carne. No entanto, esse consumo se dá mais na base da concessão do que de uma recomendação, como se Deus dissesse: “O ideal é que o homem não coma carne, mas já que ele quer…”.
Por isso, a Bíblia estabelece alguns impedimentos que, em conjunto, são chamados de leis relativas à kashrut: a carne deve estar completamente livre de sangue (Levítico 17:10-14, 19:26; e Deuteronômio 12:16, 12:23, 15:23), somente podem ser consumidos animais considerados puros (Levítico 11), e o abate de um animal deve obedecer a um determinado ritual (Levítico 17:4).
As escrituras relacionadas refletem a observância escrupulosa de muitas regras, mas tão somente no que se refere ao consumo de produtos de origem animal. As únicas condições impostas ao consumo de alimentos de origem vegetal é que estes estejam limpos, o que é facilmente compreensível, do ponto de vista sanitário.
Qual a mensagem da Bíblia, com todas essas proibições ao consumo de alimentos de origem animal? Tornar esse consumo mais refletido, duro, impraticável. É quase impossível cumprir com todas as regras impostas pela Bíblia para o consumo de carne
Justamente nisso está a graça. Com tantas regras, Deus parece de novo estar dizendo “O homem não deve comer carne”.Quando a Bíblia faz referência à generosidade divina (Deut. 8: 7-10; Deut. 11:14; Salmos 72:16, Amos 9:14-15; Jer. 29:5; Isaías 65:21), os produtos mais freqüentemente citados são os frutos, vegetais, sementes, vinho e pão, mas jamais as carnes.
Tal qual no Jardim do Éden, em que nem o homem nem os animais comiam carne, a promessa bíblica é a de que, com a vinda do Messias, novamente o mundo se tornará vegetariano. “O lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o filhote do leão e o animal doméstico andarão juntos, e um condutor pequeno os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as suas crias juntas se deitarão; o leão como o boi comerá palha. A criança de peito brincará sobre a toca da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco.” (Isaías 11: 6-8). Continua Isaías (65:25): “O lobo e o cordeiro pastarão juntos, e o leão comerá palha como o boi; pó será a comida da serpente. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, diz o SENHOR”.
FONTE
Eduardo- Mensagens : 5997
Idade : 54
Inscrição : 08/05/2010
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