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Ideologia não pode se sobrepor à ciência
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04042010
Ideologia não pode se sobrepor à ciência
O artigo Fé não pode se sobrepor à ciência de Sandro José de Souza sobre a pesquisa Datafolha sobre a criação e evolução, merece atenção pela análise (parcialmente correta segundo este blogger) e pela retórica de sua apologética ideológica em favor do naturalismo filosófico.
A escolha de grupos de ‘otimistas’ (evolucionistas) e de ‘pessimistas’ (não evolucionistas e/ou criacionistas) para a interpretação da pesquisa é mais subjetiva do que científica, pois os 59% dos que ‘acreditam’ ter sido a evolução um processo guiado por Deus ficaram de fora dessa rotulação. Segundo Sandro, os otimistas dirão que 67% dos brasileiros são evolucionistas e os pessimistas dirão que 25% são criacionistas e 59% são evolucionistas teístas.
Otimistas e pessimistas estão celebrando o que chamo de ‘vitória de Pirro’:
1. Os evolucionistas, mesmo dominando a educação com o ensino acrítico da evolução, vêem a evolução (processo cego de acaso, necessidade, mutações filtradas pela seleção [e quaisquer outros mecanismos evolutivos]) ser compreendida por uma maioria de subjetividades religiosas como sendo um processo guiado por Deus.
2. Os de subjetividades religiosas por não entenderem que o compatibilismo de seus relatos sagrados de criação com as hipóteses tranformistas de Darwin é considerada como metafísica e rejeitada pela Nomenklatura científica.
Não sei ajuizar se em uma pesquisa qualitativa percentuais possam ser considerados desprezíveis ou não. Eu incorreria em hermenêutica subjetiva onde minhas preferências ideológicas influenciariam na interpretação dos dados. Sandro considerou nada desprezível o fato de 2/3 da população brasileira ‘acreditarem’ na evolução, comparando este percentual com o de países de indicadores educacionais melhores do que os nossos. Mas também considerou nada desprezível 1/4 da população ignorar as evidências científicas a favor da evolução. Esse 1/4 da população deve ignorar completamente as evidências científicas contrárias sobre o fato da evolução que Sandro sabe existir, mas não ousa abordar publicamente: uma goleada de evidências contrárias.
Ficou surpreso que até mesmo 17% dos entrevistados com curso superior acreditem que Deus criou o homem, mas considerou a ideia de uma primeira causa na figura de um Deus, mesmo não sendo científica, como legítima. Ué, não entendi, vez que existem outras ideias que não podem ser submetidas ao rigor do método científico e que, mesmo assim, são verdadeiras. E a ciência tem várias ideias assim. Algumas nem podem, ainda, ser demonstradas verdadeiras: buracos negros, energia escura, multiversos, ancestral comum universal, y otras cositas mais.
Na sua análise sociológica, Sandro considera o evolucionismo teísta como a corrente mais moderada de criacionismo porque aceita todas as evidências científicas a favor da evolução, mas mantém Deus como agente causal. Aqui acaba o encanto de Sandro, e da Nomenklatura científica, com o evolucionismo teísta: não pode ser tratado como ciência devido à sua natureza metafísica.
Há uma situação Catch-22 aqui. Existem evolucionistas teístas que são cientistas eminentes: Kenneth Miller e Michael Behe, entre outros. Kenneth Miller é crítico severo da teoria do Design Inteligente com aval e aplauso da Nomenklatura científica. Uma espécie de política externa ‘Big Stick’. Já Michael Behe, só não foi ‘expulso’ da Lehigh University porque já tem ‘tenure’e não pode mais ser demitido. Dois pesos, duas medidas: Kenneth Miller é considerado evolucionista, mas Michael Behe é rotulado de criacionista.
Sandro está correto sobre a existência ou não de Deus não poder ser testada e por isso não ser científica, e que sua aceitação depende de um estado da mente chamado de fé. Mas está errado quando afirma que a evolução (macroevolução: um Australopithecus afarensis se tranformar em antropólogo amazonense) é fato corroborado por evidências científicas acumuladas nos últimos 150 anos. Desconheço na literatura científica qual cientista que ‘estabeleceu’definitivamente este aspecto da história evolutiva humana. Aqui, a fé darwinista remove montanhas de obstáculos encontrados no contexto de justificação teórica: o fato, Fato, FATO da evolução é um a priori aceito pela fé como verdade científica. A montanha de evidências a favor da evolução que conheço são pesquisas que demonstraram aspectos microevolutivos.
Sandro se inclue entre os otimistas. Eu, não sou nem otimista nem pessimista. Sou realista.
Concordo mais uma vez com Sandro: a predominância de uma visão teísta na população brasileira possa gerar um risco de que assuntos da fé sobreponham-se a assuntos da ciência. Não somente isso, mas assuntos ideológicos fortalecendo o naturalismo filosófico também podem gerar isso nos livros didáticos e nas aulas de ciência. Aulas de ciência devem se ater à ciência e o que isso possa representar em termos de ensino crítico de teorias científicas através de evidências. Por que não se pode criticar Darwin?
Assim como temos visto figuras públicas manifestarem-se a favor da equiparação entre evolucionismo e criacionismo, temos visto a Nomenklatura científica blindar a teoria da evolução de quaisquer críticas, mesmo as científicas, e concordar com a manutenção de duas fraudes e distorção de evidências científicas a favor do fato da evolução em livros didáticos de Biologia do ensino médio aprovados pelo MEC/SEMTEC/PNLEM. O nome disso é 171 epistêmico. Sandro sabe disso, mas se cala. E o resto da Nomenklatura científica. E a Grande Mídia também.
As escolas brasileiras que ensinam criacionismo em aulas de ciência são as escolas confessionais amparadas em documento legal do MEC. Sandro considera isso um absurdo por colocar em risco a formação de milhões de brasileiros, mas se esquece intencionalmente que esses estudantes estão sendo lesados agora mesmo na sua formação em biologia evolutiva: o que temos hoje em salas de ciência não é educação, é doutrinação em naturalismo filósofico que posa como se fosse ciência. Com duas fraudes, distorções de evidências científicas y otras cositas mais.
Ideologia não pode se sobrepor à ciência!
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Eugenia, pseudociência do irracionalismo
“Mesmo com o advento da bacteriologia, que, do ponto de vista científico, exigem-se instrumentais técnicos cada vez mais complexos para as observações dos movimentos e funcionamento dos microorganismos, em virtude da inerente dificuldade em apropriar-se materialmente de tais elementos, que, literalmente, não são apreendidos a olho nu, as questões de raça, clima ou condição social influenciavam fortemente as idéias de vários cientistas higienistas e sanitaristas. Isso significa dizer, em outras palavras que, apesar de se lançarem a uma prática materialista de observação em seus laboratórios, mapeando e procurando apreender a etiologia de bactérias e bacilos, em longos anos de experimentos, tal práxis não fora suficientemente capaz de refutar idéias preconceituosas, calcadas numa visão de classe que objetivava domesticar e controlar o proletariado. Apesar de alguns sanitaristas brasileiros de boa-fé intelectual terem dado sua vida pela causa da superação dos grandes males que eles consideravam ser do Brasil, como herança colonial, composição étnica da população, ausência de poder público na educação e saúde, seu trabalho não se torna mais científico se os mesmos não aceitarem entrar em choque contra os interesses do capital, que não se subordina a uma relação social, ao contrário, a constrói organizando-a em quase todas as instâncias da vida. A ciência requer autonomia.
No entanto, vale lembrar que tal influência não surge espontaneamente, agregando-se ao pesquisador de forma passiva. Há um momento histórico pertinente que possibilita a construção de preconceitos e estratagemas para difundi-los (como através do trabalho considerado científico e chancelado pela elite governante), sobre o qual – o momento histórico – as posições ideológicas dos/as cientistas se adequam levando em conta suas posturas de classe, ainda que o/a mesmo/a afirme que sua atividade científica seja balizada pela neutralidade que ele/a julga conter em seu trabalho. O que, de fato, leva cientistas a considerarem questões de raça, tamanho de crânio (antropometria), etc. como elementos pressupostos de cientificidade é o irracionalismo filosófico que embasa uma parcela das ciências – originando, inclusive, pseudociências, como é o caso do eugenismo. E esse irracionalismo é fruto direto do totalitarismo que se engendra com o imperialismo, cujo fruto mais relevante fora o fascismo, que triunfava durante a década de 1930. Cabe ao irracionalismo ocultar a crise da burguesia imperialista, que encaminhava a humanidade para a Segunda Guerra Mundial. Quanto à questão das falsas teses raciais e eugênicas – que estabeleciam que a humanidade se dividia em raças superiores (arianas) e inferiores –, que ganharam terreno na América Latina, Sodré (1965) lança luz sobre a historiografia para discutir tal tema:
“Às áreas que haviam permanecido sob regime colonial, ainda aquelas que tinham conquistado a autonomia política, mantendo formas de exploração meramente subsidiárias, subalternas e complementares, não se poderiam conceber condições iguais às que vigoravam, embora por força da natureza, naquelas de onde partiram os elementos humanos e materiais que as haviam aberto e fecundado. Dessa fase é que se originam os preconceitos de raça, de clima, de religião, que se fundam em escalas de valor, não apreciando as raças, os climas, as religiões como diferentes, mas sob uma escala comparativa em qualidade: climas bons e climas ruins, raças inferiores e raças superiores, religiões adiantadas e religiões atrasadas. Todo o complexo que muitos distinguem hoje sob a palavra cultura, em seu sentido sociológico, ficava subordinado a padrões de referência, conferindo-se a cada um de seus elementos um coeficiente, numa escala em que o ótimo era constituído pelo continente originário, ou mais adiantado sob o ponto de vista do desenvolvimento da riqueza; ali estava o homem mais inteligente, o ariano; ali estava o clima melhor, o temperado frio; ali estava a religião que todo mundo deveria aceitar, o cristianismo” (pág. 84).
Ainda em relação à eugenia, seu modelo epistemológico fora construído sobre alicerces das ciências naturais, cujo objetivo era revolucionar, no campo da biologia no século XX, as questões de hereditariedade. Tal modelo, que pretendia resolver questões da botânica, fora transposto ao campo das ciências sociais, cujo objetivo, no plano ideológico, era de alcançar a melhoria e a regeneração racial. Hoje sabe-se que a eugenia não passava de uma teoria racista, que buscava chancelas pseudocientíficas para sua sustentação. Os modelos ditos científicos, para as questões sociais, da escola positivista, cujo pensamento ganhava enormes terrenos entre a intelectualidade brasileira, eram advindos das ciências naturais. Os modelos das ciências naturais não têm alcance para a compreensão dos fatos sociais, uma vez que se baseiam em pressupostos cartesianos – “nós e os outros” significa poder isolar o objeto e estudá-lo a partir da neutralidade do cientista, e não significa buscar compreender as ações humanas, suas motivações e significação, e a finalidade de seus comportamentos e ações (GOLDMANN, 1979).
O encontro entre eugenia e higienismo (Boarini e Yamamoto) se deve, por exemplo, na década de 1920, com a Liga Brasileira de Higiene Mental, que tinha como objetivo a prevenção de doenças nervosas e mentais, observando os princípios de higiene geral, cujo alvo era a prevenção do indivíduo não doente e não a cura do doente (grifos meus). O projeto eugênico espraiou-se pelos meios escolares, profissionais e sociais em geral.
Reforçamos, assim, que a crítica à pseudociência da eugenia pode nos mostrar que, por intermédio de discursos travestidos de uma roupagem aparentemente racional e científica, o que existe, na realidade, é um obscurantismo do conhecimento, propositadamente manipulado para justificar ações políticas com um aval reificado de caracteres científicos. Hobsbawm (1998a), discute os modelos biológicos adotados por neopositivistas para tentar explicar o mundo social:
“O que tornou a eugenia “científica” foi justamente o surgimento da genética após 1900, que parecia sugerir a exclusão total das influências ambientais na hereditariedade e a determinação, por um único gene, da maioria ou de todas as características; isto é, que o cruzamento seletivo dos seres humanos segundo o processo mendeliano era possível. Seria pouco admissível argumentar que a genética cresceu devido às preocupações da eugenia, embora haja casos de cientistas que foram atraídos para a pesquisa sobre hereditariedade “como conseqüência de um compromisso anterior com a cultura-da-raça”.
O eugenismo, que não deixou de estar presente nas concepções de saúde pública do Brasil, pertence ao campo das teorias racistas positivistas que propõem o branqueamento da população, o que traduz um irracionalismo filosófico desenvolvido a partir do século XIX, que ganha corpo no século seguinte com as teorias arianas, tendo como pensadores Cuvier, Gobineau e Galton. No Brasil, o eugenismo encarna-se, por exemplo, em Belisário Penna, Silvio Romero e Oliveira Vianna. O eugenismo foi, como informa Stepan (1991), uma ação política adotada na América Latina, principalmente no Brasil, México e Argentina.
No Brasil, a trajetória sanitarista de Belisário Penna pode ilustrar a afirmação acima, i. é, de que foi uma ação política. Penna nasceu em 1868, em Barbacena (MG), e tornou-se médico no final do século XIX. Em 1903, Oswaldo Cruz nomeou-o para dirigir os serviços de saúde pública, cargo em que realizou campanhas sanitárias. Já em 1904, Penna desenvolveu tais atividades no Rio de Janeiro. O Rio, naquela época, passava por uma forte epidemia de varíola. E havia resistência por parte da população por essas campanhas, uma vez que entendiam como violentas tais ações sanitaristas (a Revolta da Vacina é um exemplo desse tipo de movimento, no Rio do início do século XX). Penna nunca vacilou em recolher pessoas que resistissem (os pobres) para hospitais – obviamente, não era ele própria quem fazia tal recolhimento, isso significa que o mesmo havia poder de governo e, indiretamente, de polícia para pôr em prática tal tarefa. Trabalhou em Minas Gerais para combater o impaludismo (malária) entre os operários que construíam uma estrada de ferro naquele estado, de 1906 a 1909. Esteve também junto à construção da estrada de ferro Madeira-Maroré, em 1910, para dar consultoria sobre a profilaxia da malária, que também atacava operários. Foi a Belém para estudar a febre amarela e no Nordeste para verificar as condições sanitárias daquela região. Penna esteve à frente de campanhas de saneamento para o Brasil, pois isso significava, para a intelectualidade da época, a povoação e a moralização do país. Penna era um nacionalista e, na década de 1920, apoiou o Tenentismo. Nessa mesma década (1922), exonerou-se do serviço de profilaxia em saúde pública por não concordar com interferências políticas. Penna participou do movimento eugênico, ao lado de Renato Kehl, que fora seu genro. Em 1927, Penna retorna ao serviço público, desenvolvendo atividades no sul do Brasil, aposentando-se em 1933 do serviço de sanitarismo. Em 1932, Penna filiou-se à Ação Integralista Brasileira, de Plínio Salgado. Fascista, dizia que os bolcheviques eram uma calamidade.
Além de Penna, vale destacar a presença do médico Renato Kehl. Este esteve à frente do movimento eugenista, de 1917 a 1937, numa militância acirrada. Kehl defendia a esterilização de pessoas portadoras de deficiência mental e de criminosos. Para ele, não havia outra saída para a “melhora” do ser humana a não ser pela via do biológico. Conheceu a política do Holocausto e produziu até 1947 ensaios sobre eugenia; não continuou seu trabalho por ser insustentável politicamente a defesa da eugenia depois da denúncia da existência dos campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Monteiro (1995), que também discute a questão eugênica no Brasil, assim a analisa:
“Os eugenistas pleiteavam uma legislação que permitisse separar do todo social, e mesmo proibir a prole, a todos aqueles que não contribuíssem, ou que pudessem vir a comprometer os ideais da raça, identificados como os ‘degenerados’, os portadores de moléstias infecto-contagiosas ou de taras que pudessem ser hereditárias tais como os loucos, criminosos, alcoólatras e até mesmo os pobres, uma vez que acreditavam ser a pobreza resultante da doença e, em especial dos vícios, sendo portanto patológica” (MONTEIRO, 1995: 158).
Em suma, a intelectualidade brasileira das primeiras décadas do século XX fora fortemente influenciada pela noção de que a pobreza do país era oriunda de um povo portador de uma raça fraca – pois eram miscigenados e sofriam influências do clima tropical, não ideal para a construção de uma civilização do tipo européia. O povo, na sua maioria camponês, encontrava-se doente e pouco apto ao trabalho por ser historicamente constituído a partir de raças consideradas fracas. Em suma, a refutação do discurso da inferioridade étnica da população brasileira foi um processo difícil, pois parte da intelligentzia brasileira não negava que o Brasil era um país condenado pela raça (toda e qualquer que não fosse branca), uma vez que os elementos não brancos eram propícios à indolência. E onde há indolência, torna-se mais difícil a disciplina para o trabalho, é óbvio.
Em estudo psicossocial sobre eugenia e higienismo, Boarini e Yamamoto (2004) afirmam que, em várias instâncias da vida social – educação, saúde coletiva –, é comum que as dificuldades e problemas de uma pessoa nas relações justifiquem-se ao culpabilizar o indivíduo, deslocando-se, assim, do eixo social. Medicaliza-se e psicologiza-se para explanar questões de esfera social. Historicamente, pode-se constatar que, por exemplo, a “medicalização, salvo erro de generalização, é o cerne do pensamento higienista” (BOARINI et YAMAMOTO, 2004: 3). As instituições brasileiras tiveram, como contribuição à sua sustentação, bases teóricas de caráter higienista e eugenista, entre o final do século XIX e o começo do XX.
Deixando, por ora, a questão particular do eugenismo, que fora dirigida por sanitaristas, elevemo-nos à geral da saúde pública. Segundo Hochman (1993), a afirmação de que “as políticas de saúde pública tiveram um papel central na criação e no aumento da capacidade do Estado brasileiro de intervir sobre o território nacional e efetivamente integrá-lo” é fundamental para pensarmos sobre o processo de consolidação política do território brasileiro a partir de ações sanitaristas. Mas, também nesse texto, o autor, provavelmente por não considerar que a instância econômica, enquanto momento central da organização da vida do ser social, diz que se afasta da perspectiva de análise da saúde pública associada à dinâmica do capital, pois considerar o econômico seria lançar mão de uma visão determinista, que não responde ao processo de construção de “aparatos públicos e centralizados para implementar políticas de saúde” (HOCHMAN, 1993: 41). Lima e Hochman entendem que o movimento sanitarista brasileiro do início do século XX tinha “papel central e prolongado na reconstrução da identidade nacional, a partir da identificação da doença como elemento distintivo da condição de ser brasileiro” (LIMA et HOCHMAN, 2000: 318). Louvável tal esforço para entender a formação histórica brasileira. No entanto, tal movimento, constituído por elementos intelectuais, conscientes ou não de sua postura ideológica, respondia, na produção de ações políticas de cunho dito científico, no campo da organização da saúde pública, pela necessidade de garantir uma nascente classe trabalhadora urbana, controlada e educada minimamente para adaptar-se à nascente industrialização, que tem métodos de organização e gestão. Esta questão será tratada no Capítulo.”
---
É isso!
Fonte:
Ivan Ducatti : “A hanseníase no Brasil na Era Vargas e a profilaxia do isolamento compulsório: estudos sobre o discurso científico legitimador”. (Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade São Paulo, para a obtenção do título de Doutor em História. Orientador: Prof. Dr. Marcos Antônio da Silva). Universidade São Paulo – USP. São Paulo, 2008.
Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
Última edição por Ronaldo em Seg Abr 12, 2010 9:48 pm, editado 1 vez(es)
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Ideologia não pode se sobrepor à ciência :: Comentários
Maioria dos brasileiros acredita em Deus e em Darwin
Segundo pesquisa Datafolha publicada na edição de hoje do jornal Folha de S. Paulo, a maioria dos brasileiros de 16 anos ou mais (59%) acredita que “os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus guiando esse processo de evolução”. A pesquisa foi realizada nos dias 25 e 26 de março de 2010, com 4.158 pessoas. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Uma parcela menor (25%) acredita, porém, que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”, opinião diferente de outros 8%, que acreditam que “os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas sem a participação de Deus nesse processo”. Os espíritas são os que mais acreditam em um processo de evolução do homem a partir de outras formas de vida sob o comando de Deus (74% do segmento), parcela que é próxima aos 60% tanto entre os católicos quanto entre os evangélicos pentecostais e não-pentecostais. Destaca-se a parcela de umbandistas (33%) e de evangélicos pentecostais (30%) que acreditam que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”. A pesquisa constatou também que, quanto maior a renda e a escolaridade, mais pessoas acreditam na interferência divina no desenvolvimento dos seres humanos.
Na quarta-feira, por indicação do repórter Reinaldo José Lopes (que me entrevistou semanas atrás), fui contatado pelo Hélio Schwartsman, da Folha, que me pediu para escrever um pequeno artigo sobre criacionismo. Leia abaixo a íntegra do que escrevi:
Criacionismo: modelo mal-compreendido
Quando nos deparamos com o desafio de explicar eventos passados únicos e irreproduzíveis – como a origem da vida e a origem do ser humano –, acabamos ultrapassando as fronteiras da própria metodologia científica. Assim, consciente ou inconscientemente, no processo de construção de modelos, utilizamos inevitavelmente conhecimento suplementar de natureza não científica (o que não significa necessariamente conhecimento anticientífico). Nesse sentido, o cientista evolucionista utilizará conhecimentos oriundos do naturalismo metafísico (componente não científico do evolucionismo). Da mesma forma, o cientista criacionista, ao procurar explicar as origens, verificará a possibilidade de se harmonizar o conhecimento científico com o conhecimento bíblico (componente não científico do criacionismo). Podemos, então, definir os dois paradigmas em questão:
Evolucionismo: possível relação funcional entre as ciências naturais e o naturalismo metafísico (pelo menos no que diz respeito aos temas sobre as origens).
Criacionismo: cosmovisão que procura integrar o conhecimento bíblico-histórico com o conhecimento científico.
Embora a maioria dos brasileiros acredite que Deus guiou a evolução, essa conclusão é contraditória, pois a noção de Deus dessas pessoas pesquisadas provavelmente provenha da tradição cristã. Só que a Bíblia que lhes fornece a base conceitual para definir Deus afirma que o Criador trouxe à existência a vida neste planeta em seis dias literais de 24 horas – e isso não está relatado apenas em Gênesis, e o próprio Jesus se refere a Adão e Eva como personagens históricos. A coerência estaria em optar entre ser naturalista ou teísta. O “meio-termo” é confusão filosófico-teológica na certa.
Dos entrevistados pelo Datafolha, 25% acreditam que Deus criou os seres humanos exatamente como são hoje. São, portanto, fixistas. Ao contrário desses, criacionistas bem informados entendem que Deus dotou os seres vivos com a capacidade de variação, o que lhes permite sobreviver em ambientes diferenciados adquirindo adaptabilidade ao meio em que vivem. A isso chamam de “microevolução” ou “diversificação de baixo nível” (níveis taxonômicos inferiores).
Assim, segundo a visão criacionista, Deus criou os tipos básicos de seres vivos e eles sofreram modificações, dentro de certos limites pré-estabelecidos, originando as formas de vida que encontramos em nossos dias. Dizer que elas descendem de um mesmo ancestral unicelular comum é extrapolação. Embora essa ideia tenha sido apresentada como verdade, não tem sido empírica e biologicamente demonstrável.
As grandes questões para as quais parece não haver respostas satisfatórias são: Qual a origem da informação complexa, aperiódica e específica? Qual a origem dos códigos zipados, encriptados, compartimentados e com uma lógica algorítmica que, hoje sabemos, tem em seres inteligentes sua única causa, suficiente e necessária? Qual a origem dos sistemas irredutivelmente complexos? Como se deu o aumento de complexidade que seria imprescindível para criar novas maquinarias e órgãos e funções necessários para migrar de uma espécie para outra? Em relação ao registro fóssil, como explicar a Explosão Cambriana com o surgimento repentino de formas de vida complexas sem ancestrais detectáveis? E como explicar a falta de formas transicionais entre os principais filos?
O criacionista, partindo da ideia de planejamento e propósito inteligentes na criação, consegue fornecer boas respostas para essas questões – mas, primeiro, precisa ser ouvido e compreendido. Portanto, vejo com bons olhos a iniciativa da Folha, ao perseguir um dos princípios básicos do jornalismo: ouvir todas as versões.
Michelson Borges
Jornalista e editor do blog www.criacionismo.com.br
P.S.: Creio que se o povo brasileiro tivesse acesso àquilo que o criacionismo verdadeiramente ensina, e se soubesse a diferença entre micro e macroevolução, os percentuais dessa pesquisa seriam outros. O ideal seria que houvesse esclarecimento por parte da mídia e que outra pesquisa fosse feita com perguntas mais específicas, afinal, a palavra "evolução" tem significados diversos, dependendo do contexto em que é aplicada ou entendida.[MB]
Última edição por Ronaldo em Dom Abr 04, 2010 10:26 am, editado 1 vez(es)
Segundo pesquisa Datafolha publicada na edição de hoje do jornal Folha de S. Paulo, a maioria dos brasileiros de 16 anos ou mais (59%) acredita que “os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus guiando esse processo de evolução”. A pesquisa foi realizada nos dias 25 e 26 de março de 2010, com 4.158 pessoas. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Uma parcela menor (25%) acredita, porém, que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”, opinião diferente de outros 8%, que acreditam que “os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas sem a participação de Deus nesse processo”. Os espíritas são os que mais acreditam em um processo de evolução do homem a partir de outras formas de vida sob o comando de Deus (74% do segmento), parcela que é próxima aos 60% tanto entre os católicos quanto entre os evangélicos pentecostais e não-pentecostais. Destaca-se a parcela de umbandistas (33%) e de evangélicos pentecostais (30%) que acreditam que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”. A pesquisa constatou também que, quanto maior a renda e a escolaridade, mais pessoas acreditam na interferência divina no desenvolvimento dos seres humanos.
Na quarta-feira, por indicação do repórter Reinaldo José Lopes (que me entrevistou semanas atrás), fui contatado pelo Hélio Schwartsman, da Folha, que me pediu para escrever um pequeno artigo sobre criacionismo. Leia abaixo a íntegra do que escrevi:
Criacionismo: modelo mal-compreendido
Quando nos deparamos com o desafio de explicar eventos passados únicos e irreproduzíveis – como a origem da vida e a origem do ser humano –, acabamos ultrapassando as fronteiras da própria metodologia científica. Assim, consciente ou inconscientemente, no processo de construção de modelos, utilizamos inevitavelmente conhecimento suplementar de natureza não científica (o que não significa necessariamente conhecimento anticientífico). Nesse sentido, o cientista evolucionista utilizará conhecimentos oriundos do naturalismo metafísico (componente não científico do evolucionismo). Da mesma forma, o cientista criacionista, ao procurar explicar as origens, verificará a possibilidade de se harmonizar o conhecimento científico com o conhecimento bíblico (componente não científico do criacionismo). Podemos, então, definir os dois paradigmas em questão:
Evolucionismo: possível relação funcional entre as ciências naturais e o naturalismo metafísico (pelo menos no que diz respeito aos temas sobre as origens).
Criacionismo: cosmovisão que procura integrar o conhecimento bíblico-histórico com o conhecimento científico.
Embora a maioria dos brasileiros acredite que Deus guiou a evolução, essa conclusão é contraditória, pois a noção de Deus dessas pessoas pesquisadas provavelmente provenha da tradição cristã. Só que a Bíblia que lhes fornece a base conceitual para definir Deus afirma que o Criador trouxe à existência a vida neste planeta em seis dias literais de 24 horas – e isso não está relatado apenas em Gênesis, e o próprio Jesus se refere a Adão e Eva como personagens históricos. A coerência estaria em optar entre ser naturalista ou teísta. O “meio-termo” é confusão filosófico-teológica na certa.
Dos entrevistados pelo Datafolha, 25% acreditam que Deus criou os seres humanos exatamente como são hoje. São, portanto, fixistas. Ao contrário desses, criacionistas bem informados entendem que Deus dotou os seres vivos com a capacidade de variação, o que lhes permite sobreviver em ambientes diferenciados adquirindo adaptabilidade ao meio em que vivem. A isso chamam de “microevolução” ou “diversificação de baixo nível” (níveis taxonômicos inferiores).
Assim, segundo a visão criacionista, Deus criou os tipos básicos de seres vivos e eles sofreram modificações, dentro de certos limites pré-estabelecidos, originando as formas de vida que encontramos em nossos dias. Dizer que elas descendem de um mesmo ancestral unicelular comum é extrapolação. Embora essa ideia tenha sido apresentada como verdade, não tem sido empírica e biologicamente demonstrável.
As grandes questões para as quais parece não haver respostas satisfatórias são: Qual a origem da informação complexa, aperiódica e específica? Qual a origem dos códigos zipados, encriptados, compartimentados e com uma lógica algorítmica que, hoje sabemos, tem em seres inteligentes sua única causa, suficiente e necessária? Qual a origem dos sistemas irredutivelmente complexos? Como se deu o aumento de complexidade que seria imprescindível para criar novas maquinarias e órgãos e funções necessários para migrar de uma espécie para outra? Em relação ao registro fóssil, como explicar a Explosão Cambriana com o surgimento repentino de formas de vida complexas sem ancestrais detectáveis? E como explicar a falta de formas transicionais entre os principais filos?
O criacionista, partindo da ideia de planejamento e propósito inteligentes na criação, consegue fornecer boas respostas para essas questões – mas, primeiro, precisa ser ouvido e compreendido. Portanto, vejo com bons olhos a iniciativa da Folha, ao perseguir um dos princípios básicos do jornalismo: ouvir todas as versões.
Michelson Borges
Jornalista e editor do blog www.criacionismo.com.br
P.S.: Creio que se o povo brasileiro tivesse acesso àquilo que o criacionismo verdadeiramente ensina, e se soubesse a diferença entre micro e macroevolução, os percentuais dessa pesquisa seriam outros. O ideal seria que houvesse esclarecimento por parte da mídia e que outra pesquisa fosse feita com perguntas mais específicas, afinal, a palavra "evolução" tem significados diversos, dependendo do contexto em que é aplicada ou entendida.[MB]
Última edição por Ronaldo em Dom Abr 04, 2010 10:26 am, editado 1 vez(es)
Deus e Darwin nos trópicos: visões mais do que extremas da criação e evolução
Esta pesquisa Datafolha (publicada na Folha de São Paulo, 02/04/2010) sobre o criacionismo e as teorias sobre a origem e o desenvolvimento da espécie humana, revelou dados interessantes e esdrúxulos sobre criacionistas e evolucionistas. Um dado intrigante vai tirar o sono dos líderes religiosos e da Nomenklatura científica: a maioria dos brasileiros de 16 anos ou mais (59%) acredita na evolução humana ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus guiando o processo evolutivo. Darwin, quem diria, já não é mais um ‘estranho’ no ninho, oops, nos templos.
O contraste da ‘crença’ de criacionistas e evolucionistas também é interessante. Os criacionistas da Terra jovem ainda são maioria no Brasil: 25% acreditam que Deus criou os seres humanos do jeito que são hoje, há uns dez mil anos atrás. Os evolucionistas (8%) ‘acreditam’ [sic] que os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, sem a participação de Deus. Acreditar é exercer fé. Para os criacionistas, acreditar não é novidade, mas evolucionistas ‘crentes’ é uma novidade sociológica que merece estudos: a religião é o ópio do povo.
Não foi novidade nenhuma o posicionamento dos espíritas ser majoritário quanto ao processo de evolução humana a partir de outras formas de vida sob o comando de Deus (74%), pois o transformismo faz parte do seu credo. A novidade é a parcela dos espíritas ser próxima (60%) entre católicos, evangélicos pentecostais e não-pentecostais. Uma possível indicação de sincretismo religioso. Abaixo da linha do Equador vale tudo. E no Brasil, até óleo se mistura com água. Lévi-Strauss que o diga.
Os criacionistas da Terra jovem (a maioria composta por adventistas de comportamento litúrgico sóbrio) vão ficar bastante incomodados em terem sido achados entre umbandistas (33%) e evangélicos pentecostais (30%): eles também acreditam que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”. A maior surpresa é que, apesar de a visão evolucionista ser a única ensinada nas aulas de ciência, a pesquisa Datafolha mostrou que esses resultados estão acima da média da população. Huxley Dawkins e Dennett devem estar se perguntando: “Onde foi que nós erramos?”
Um dado extremamente inusitado é que até entre ateus há uma pequena parcela que ‘acredita’ ter Deus guiado o processo de evolução das espécies (23%). Nietzsche deve estar se revirando no túmulo. É, mas vai que Deus existe. Não custa nada se prevenir... A maioria dos ateus (56%), ‘crê’ [sic] que Deus não interferiu no desenvolvimento dos seres humanos. Uma possível indicação de que o darwinismo, qua ideologia, promove o ateísmo.
Diferentemente de pesquisas semelhantes realizadas nos Estados Unidos e União Europeia, nos diferentes segmentos brasileiros dá-se o contrário - quanto maior a renda e a escolaridade, mais pessoas acreditam na interferência divina no processo evolutivo dos seres humanos. Aqui ocorreu o inverso: o suspiro por Deus não é somente dos pobres e oprimidos. Nem Freud explica. Muito menos Marx.
Ah, não podia faltar o fosso entre as gerações. Nas diferentes faixas de idade, os jovens de 16-24 anos acreditam mais do que os mais velhos que Deus guiou o processo evolutivo das espécies. Estase epistêmica dos idosos ou os mais jovens ainda não ‘evoluíram’ o suficiente para distinguir a esquerda da direita?
Os índices também variaram nas diferentes regiões do Brasil. No Sul 51% dos entrevistados aceitam que a evolução humana se deu ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus dirigindo o processo evolucionário. No Nordeste sobe para 63% e Norte/Centro Oeste para 66%. Ó xente, bixim, tá cum a muléstia darwiniana!
+++++
NOTA DESTE BLOGGER:
Eu fui convidado por Hélio Schwartsman, da FSP, mas declinei e indiquei nome de outras pessoas que talvez topariam o convite. Depois me arrependi, mas já era tarde, pois o convidado já tinha aceito o convite. Duas coisas ficam patentes nesta situação: eu não posso mais dizer que a Folha de São Paulo 'não dá espaço' para visões diferentes de Darwin, mas a FSP ainda continua fazendo a leitura errada do Design Inteligente -- sistemas biológicos de complexidade irredutível e informação complexa especificada não são encontrados na Torá, nem na Bíblia dos cristãos, tampouco no Alcorão, mas nas coisas bióticas e outras coisas no universo, mas Hélio Schwartsman insistiu em rotular o DI como "nada mais é do que criacionismo com pretensões científicas." Eu não sabia que complexidade irredutível de sistemas bióticos e informação complexa especificada -- temas recorrentes em pesquisas científicas e artigos científicos, a favor e contra, sejam "Artigos de Fé".
Falta agora a Folha de São Paulo, após ter sido alertada por este blogger há mais de uma década, cobrir as insuficiências epistêmicas da atual teoria da evolução no contexto de justificação teórica, e por que uma nova teoria da evolução está sendo elaborada -- a SÍNTESE EVOLUTIVA AMPLIADA que, pelo avanço da ciência em várias áreas, não pode e nem deve ser selecionista. Mas isso a FSP não tem coragem de cobrir, pois vive uma relação incestuosa com a Nomenklatura científica, e pela Weltanschauung da maioria dos que compõem seu corpo editorial (ateus, agnósticos y otras cositas mais), está atrelada ao naturalismo filosófico que posa como se fosse a própria ciência, hoje não tem coragem de fazer isso, mas talvez um dia, quem sabe amanhã mesmo, ouse ser corajosa e aborde a nudez epistêmica de Darwin.
Mesmo assim, já foi um avanço. Valeu Hélio!
Esta pesquisa Datafolha (publicada na Folha de São Paulo, 02/04/2010) sobre o criacionismo e as teorias sobre a origem e o desenvolvimento da espécie humana, revelou dados interessantes e esdrúxulos sobre criacionistas e evolucionistas. Um dado intrigante vai tirar o sono dos líderes religiosos e da Nomenklatura científica: a maioria dos brasileiros de 16 anos ou mais (59%) acredita na evolução humana ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus guiando o processo evolutivo. Darwin, quem diria, já não é mais um ‘estranho’ no ninho, oops, nos templos.
O contraste da ‘crença’ de criacionistas e evolucionistas também é interessante. Os criacionistas da Terra jovem ainda são maioria no Brasil: 25% acreditam que Deus criou os seres humanos do jeito que são hoje, há uns dez mil anos atrás. Os evolucionistas (8%) ‘acreditam’ [sic] que os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, sem a participação de Deus. Acreditar é exercer fé. Para os criacionistas, acreditar não é novidade, mas evolucionistas ‘crentes’ é uma novidade sociológica que merece estudos: a religião é o ópio do povo.
Não foi novidade nenhuma o posicionamento dos espíritas ser majoritário quanto ao processo de evolução humana a partir de outras formas de vida sob o comando de Deus (74%), pois o transformismo faz parte do seu credo. A novidade é a parcela dos espíritas ser próxima (60%) entre católicos, evangélicos pentecostais e não-pentecostais. Uma possível indicação de sincretismo religioso. Abaixo da linha do Equador vale tudo. E no Brasil, até óleo se mistura com água. Lévi-Strauss que o diga.
Os criacionistas da Terra jovem (a maioria composta por adventistas de comportamento litúrgico sóbrio) vão ficar bastante incomodados em terem sido achados entre umbandistas (33%) e evangélicos pentecostais (30%): eles também acreditam que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”. A maior surpresa é que, apesar de a visão evolucionista ser a única ensinada nas aulas de ciência, a pesquisa Datafolha mostrou que esses resultados estão acima da média da população. Huxley Dawkins e Dennett devem estar se perguntando: “Onde foi que nós erramos?”
Um dado extremamente inusitado é que até entre ateus há uma pequena parcela que ‘acredita’ ter Deus guiado o processo de evolução das espécies (23%). Nietzsche deve estar se revirando no túmulo. É, mas vai que Deus existe. Não custa nada se prevenir... A maioria dos ateus (56%), ‘crê’ [sic] que Deus não interferiu no desenvolvimento dos seres humanos. Uma possível indicação de que o darwinismo, qua ideologia, promove o ateísmo.
Diferentemente de pesquisas semelhantes realizadas nos Estados Unidos e União Europeia, nos diferentes segmentos brasileiros dá-se o contrário - quanto maior a renda e a escolaridade, mais pessoas acreditam na interferência divina no processo evolutivo dos seres humanos. Aqui ocorreu o inverso: o suspiro por Deus não é somente dos pobres e oprimidos. Nem Freud explica. Muito menos Marx.
Ah, não podia faltar o fosso entre as gerações. Nas diferentes faixas de idade, os jovens de 16-24 anos acreditam mais do que os mais velhos que Deus guiou o processo evolutivo das espécies. Estase epistêmica dos idosos ou os mais jovens ainda não ‘evoluíram’ o suficiente para distinguir a esquerda da direita?
Os índices também variaram nas diferentes regiões do Brasil. No Sul 51% dos entrevistados aceitam que a evolução humana se deu ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus dirigindo o processo evolucionário. No Nordeste sobe para 63% e Norte/Centro Oeste para 66%. Ó xente, bixim, tá cum a muléstia darwiniana!
+++++
NOTA DESTE BLOGGER:
Eu fui convidado por Hélio Schwartsman, da FSP, mas declinei e indiquei nome de outras pessoas que talvez topariam o convite. Depois me arrependi, mas já era tarde, pois o convidado já tinha aceito o convite. Duas coisas ficam patentes nesta situação: eu não posso mais dizer que a Folha de São Paulo 'não dá espaço' para visões diferentes de Darwin, mas a FSP ainda continua fazendo a leitura errada do Design Inteligente -- sistemas biológicos de complexidade irredutível e informação complexa especificada não são encontrados na Torá, nem na Bíblia dos cristãos, tampouco no Alcorão, mas nas coisas bióticas e outras coisas no universo, mas Hélio Schwartsman insistiu em rotular o DI como "nada mais é do que criacionismo com pretensões científicas." Eu não sabia que complexidade irredutível de sistemas bióticos e informação complexa especificada -- temas recorrentes em pesquisas científicas e artigos científicos, a favor e contra, sejam "Artigos de Fé".
Falta agora a Folha de São Paulo, após ter sido alertada por este blogger há mais de uma década, cobrir as insuficiências epistêmicas da atual teoria da evolução no contexto de justificação teórica, e por que uma nova teoria da evolução está sendo elaborada -- a SÍNTESE EVOLUTIVA AMPLIADA que, pelo avanço da ciência em várias áreas, não pode e nem deve ser selecionista. Mas isso a FSP não tem coragem de cobrir, pois vive uma relação incestuosa com a Nomenklatura científica, e pela Weltanschauung da maioria dos que compõem seu corpo editorial (ateus, agnósticos y otras cositas mais), está atrelada ao naturalismo filosófico que posa como se fosse a própria ciência, hoje não tem coragem de fazer isso, mas talvez um dia, quem sabe amanhã mesmo, ouse ser corajosa e aborde a nudez epistêmica de Darwin.
Mesmo assim, já foi um avanço. Valeu Hélio!
Catch-22: editorial da Folha de São Paulo entre a cruz e a espada epistêmica
Segunda-feira, Abril 05, 2010
O editorial “Entre Deus e Darwin” da Folha de São Paulo publicado em 02/04/10 [acesso integral para assinantes da FSP e do UOL] sobre recente Pesquisa Datafolha revelando que 59% (a maioria) dos brasileiros ‘endossam’ um credo religioso-epistêmico do crioulo doido tupiniquim: “a aceitação do processo darwiniano com a fé na condução e supervisão divina, situadas num plano superior ao da natureza” é para ser lido cum grano salis. A pesquisa mostra a criatividade do bom malandro brasileiro: conseguiu misturar água com óleo, e diminuiu Deus em sua onipotência criativa e Darwin em sua onisciência científica que o editorial louvou como sendo “discernimento intuitivo de que questões de ciência não competem com convicção religiosa”.
Povo sábio e pragmático este de Pindorama: uma vela para Deus e outra para o Diabo, oops para Darwin. É melhor se garantir: vai que Deus não existe e Darwin está certo? Ou que Deus existe, mas, contrariando a Darwin, consegue ‘dirigir’ este processo evolutivo’? O agravante aqui do credo religioso-epistêmico tupiniquim é que Darwin disse que se a sua teoria da evolução através da seleção natural precissasse de ‘ajuda externa’[leia-se Deus] seria ‘bulshit’. Traduzindo em graúdos do inglês para o tupi — titica de galinha!
Será que o povo sábio e pragmático de Pindorama sabe disso? Duvido. Pouca gente letrada, até com Ph. D. sabe disso. Os que sabem, especialmente historiadores de ciencia, ficam em silêncio pétreo: é crime de lésè majesté criticar Darwin na Nomenklatura científica. Pecado mortal acadêmico. Inquisição sem fogueiras. Sei do que estou falando. Já passei por isso.
Interessante o editorial citar a resposta irônica que J. B. S. Haldane (1892-1964), biólogo ateu e comunista, deu à pergunta sobre o que a teoria da seleção natural revelava sobre os desígnios de Deus: “Uma apaixonada predileção por besouros.” Como, cientificamene, Haldane teve acesso ao gosto estético do Eterno? Ele tinha acesso via DDD [Discagem Direta a D's]? Haldane não disse. Nem a pergunta, tampouco a resposta são científicas. Por quê? Questões metafísicas estão fora do pálio científico, lembra-se?
A Nomenklatura científica e a editoria de ciência da FSP sabem que existe uma relação de custo e benefício na ação da seleção natural nas coisas bióticas, e que nenhuma teoria evolutiva que se preze pode desconsiderar. É o chamado ‘dilema de Haldane’ que o editorial da FSP, talvez por razões de espaço, ou intencionalmente deixou de fora. Esta é uma questão científica que a Nomenklatura científica ainda não respondeu a contento, e prefere que muitos (até biólogos) desconheçam. Pro bono scientia, leia aqui o artigo original de Haldane e a ‘revisitação’ do dilema de Haldane.
Segundo a Pesquisa Datafolha, somente 8% dos brasileiros (a raça dos darwinistas ‘puros’) endossariam Haldane: “os seres vivos são produto de lentíssima evolução na qual variações fortuitas, mas vantajosas à sobrevivência e reprodução, se disseminam e acabam por dar origem a novas espécies, mais adaptadas a seu ambiente.” Ora, a evolução é tanto um processo lento e gradual ao longo de milhões de anos, bem como rápido — vapt, vupt evolução ocorrendo diante de nossos olhos. Um verdadeiro smorgasbord epistêmico. Self-service.
Embora eu tenha sido um péssimo aluno em matemática, eu fiquei sem entender porque é expressiva a parcela de 25% dos brasileiros. E aqui eu abro um parêntese e vou ser o advogado do Diabo dos criacionistas. A parcela é ‘expressiva’, embora identifique uma minoria, é porque ela descreve pessoas que ‘se mostram criacionistas, pois acreditam que os seres vivos tenham sido concebidos e materializados por Deus num único ato criativo.’ Eu penso que aqui, o ranço naturalista (posição subjetiva) falou mais alto do que a razão matemática.
Embora nos EUA estejam ‘enraizadas facções do cristianismo evangélico’ literalistas, e ‘os criacionistas são estimados em 45%’, o editorial da FSP afirmou não haver surpresa que naquele país somente ‘as implicações filosóficas e religiosas do darwinismo alcancem estridente controvérsia’, com ‘disputas judiciais renhidas a fim de preservar o ensino laico de contaminações religiosas’. E as razões seculares criticando a Darwin, não contam? Já adianto logo para a editoria jurídica da FSP: não existe nenhuma decisão da Suprema Corte Americana proibindo o ensino das evidências a favor e contra a teoria da evolução por razões estritamente seculares.
A versão atual da teoria da evolução de Darwin, o neodarwinismo, oops, Claudio Angelo prefere Síntese Evolutiva Moderna, foi considerada uma teoria morta po ninguém nada menos do que Stephen Jay Gould (mencionado cripticamente no fim do editorial) em artigo publicado em1980.
A FSP sabe, mas não repassa para seus leitores: nos Estados Unidos os cidadãos podem sim questionar nos Conselhos Educacionais e até na justiça aspectos educacionais, y otras cositas mais. Querer o ensino unilateral da teoria da evolução através da seleção natural sem críticas, quando já falamos na revisão teórica do darwinismo, é inaceitável em pleno século 21.
A pesquisa Datafolha no Brasil trouxe resultados parecidos com pesquisas realizadas na Europa com cenário variado: na Itália, Irlanda e Polônia, o índice de criacionistas se aproxima do brasileiro, sugerindo que, segundo o editorial da FSP, ‘nas nações de maioria católica essa questão não é relevante, talvez nem pertinente’porque ‘os católicos sempre estiveram à vontade com interpretações figuradas do evangelho’. É vero, mas pode ser o contrário. Especialmente levando-se em conta uma Europa completamente secularizada, mesmo nesses países de ‘maioria católica’como o Brasil.
Quando abordou o resultado da maioria dos brasileiros (59%) combinar a aceitação do processo evolutivo darwiniano com a fé na condução e supervisão divina, situadas num plano superior ao da natureza, o editorial da FSP, a la Macunaíma, afirmou que pode parecer inverossímil aos olhos dos ateus, mas essa conciliação de crenças não é absurda porque sugere nos evolucionistas teístas ‘um discernimento intuitivo de que questões de ciência não competem com questões de convicção religiosa’, pois `são campos que correspondem a dimensões diferentes da consciência humana’.
Gravura de Benett - Tubo de Ensaio
Ué, assopra e morde agora com o NOMA [Non-overlapping Magisteria, magistérios não sobrepostos] de Gould? Traduzindo em graúdos: ‘ado, ado, ado, cada um no seu quadrado!’
Para consolo da Nomenklatura científica, ‘o darwinismo dito "puro" tende a crescer conforme aumenta a educação formal’, mas aqui cabe a pergunta causticante deste blogger: Educação formal ou doutrinação formal? Se Darwin é ensinado acriticamente, não causa nenhuma surpresa que os que foram assim ‘doutrinados’ desde o ensino fundamental até à universidade reflitam esse darwinismo ‘puro’. Será que se as evidências a favor e contra a evolução fizesse parte da abordagem nos livros didáticos de Biologia e nas aulas de ciência, o darwinismo ainda seria assim tão ‘puro’? Duvido, e a Nomenklatura científica treme na base e perde o sono só de pensar nesta possibilidade maquiavélica contra o homem que teve a maior ideia que toda a humanidade já teve.
Correndo o risco de ter uma ‘fatwa’ emitida contra si, o editor contrastou os índices mais altos de darwinismo ‘puro’ na Europa (países escandinavos) com a Turquia (mais da metade da população criacionista) supondo que nos ‘países de predomínio islâmico essa marca se repita ou seja suplantada, pois o Islã tende a adotar uma visão mágica e literal do advento do homem na Terra’. Sugiro ao editor procurar asilo rapidamente em algum país escandinavo!
No final, o editorial da FSP, fiel e infiel na sua relação incestuosa com a Nomenklatura científica, enveredou para a defesa do ‘discurso único’ sobre a teoria da evolução e do credo religioso-epistêmico do crioulo doido tupiniquim: ‘O levantamento Datafolha desencoraja certa tendência a importar uma polêmica que pode fazer sentido nos EUA, mas que não se sustenta em nossa realidade cultural.’ Razão? O desafio brasileiro de ‘reunir a rua e a casa, a lei e a família, o sobrenatural e o prosaico’, identificado há algumas décadas pelo antropólogo Roberto Da Matta, parece que na questão religião e darwinismo, ‘esse sincretismo à brasileira já vigora.’
Que o sincretismo a la Macunaíma já vigora no Brasil não se discute. O que é discutível e deplorável no editorial da FSP é a sugestão de que os dados ‘desencoraja certa tendência a importar uma polêmica que pode fazer sentido nos EUA, mas que não se sustenta em nossa realidade cultural.’ Nada mais completamente falso. Tanto nos EUA como no Brasil, esta polêmica tem tudo a ver com a ciência, apesar do ‘ruído religioso’. Se existem críticos religiosos de Darwin, muitos deles encontraram e encontram essas críticas e argumentos em pesquisas e artigos de cientistas que afirmaram e afirmam desde 1859 que Darwin não fecha as contas em um contexto de justificação teórica, que a teoria da evolução através da seleção natural é ciência capenga, y otras cositas mais.
Os verdadeiros culpados por isso são os cientistas, pois, felizmente, a ciência é a busca pela verdade, e foram eles que fizeram a ciência da falsificação das hipóteses transformistas de Darwin, que foi encontrado e demonstrado correto e errado: acertou no varejo (microevolução) e errou no atacado (macroevolução). Não querer que este debate público prospere e ocorra no Brasil é estranho. Mui estranho...
Ah, será que a Pesquisa Datafolha e o editorial da FSP foram 'factoides' criados para esvaziar o III Simpósio Internacional “Darwinismo Hoje” na Universidade Presbiteriana Mackenzie agora em abril? Não, mil vezes não. É muita 'teoria de conspiração', mas vai que é vero? Como historiador de ciência em formação, eu não me esqueço do modus operandi do X Club, de Huxley, Hooker et al...
Segunda-feira, Abril 05, 2010
O editorial “Entre Deus e Darwin” da Folha de São Paulo publicado em 02/04/10 [acesso integral para assinantes da FSP e do UOL] sobre recente Pesquisa Datafolha revelando que 59% (a maioria) dos brasileiros ‘endossam’ um credo religioso-epistêmico do crioulo doido tupiniquim: “a aceitação do processo darwiniano com a fé na condução e supervisão divina, situadas num plano superior ao da natureza” é para ser lido cum grano salis. A pesquisa mostra a criatividade do bom malandro brasileiro: conseguiu misturar água com óleo, e diminuiu Deus em sua onipotência criativa e Darwin em sua onisciência científica que o editorial louvou como sendo “discernimento intuitivo de que questões de ciência não competem com convicção religiosa”.
Povo sábio e pragmático este de Pindorama: uma vela para Deus e outra para o Diabo, oops para Darwin. É melhor se garantir: vai que Deus não existe e Darwin está certo? Ou que Deus existe, mas, contrariando a Darwin, consegue ‘dirigir’ este processo evolutivo’? O agravante aqui do credo religioso-epistêmico tupiniquim é que Darwin disse que se a sua teoria da evolução através da seleção natural precissasse de ‘ajuda externa’[leia-se Deus] seria ‘bulshit’. Traduzindo em graúdos do inglês para o tupi — titica de galinha!
Será que o povo sábio e pragmático de Pindorama sabe disso? Duvido. Pouca gente letrada, até com Ph. D. sabe disso. Os que sabem, especialmente historiadores de ciencia, ficam em silêncio pétreo: é crime de lésè majesté criticar Darwin na Nomenklatura científica. Pecado mortal acadêmico. Inquisição sem fogueiras. Sei do que estou falando. Já passei por isso.
Interessante o editorial citar a resposta irônica que J. B. S. Haldane (1892-1964), biólogo ateu e comunista, deu à pergunta sobre o que a teoria da seleção natural revelava sobre os desígnios de Deus: “Uma apaixonada predileção por besouros.” Como, cientificamene, Haldane teve acesso ao gosto estético do Eterno? Ele tinha acesso via DDD [Discagem Direta a D's]? Haldane não disse. Nem a pergunta, tampouco a resposta são científicas. Por quê? Questões metafísicas estão fora do pálio científico, lembra-se?
A Nomenklatura científica e a editoria de ciência da FSP sabem que existe uma relação de custo e benefício na ação da seleção natural nas coisas bióticas, e que nenhuma teoria evolutiva que se preze pode desconsiderar. É o chamado ‘dilema de Haldane’ que o editorial da FSP, talvez por razões de espaço, ou intencionalmente deixou de fora. Esta é uma questão científica que a Nomenklatura científica ainda não respondeu a contento, e prefere que muitos (até biólogos) desconheçam. Pro bono scientia, leia aqui o artigo original de Haldane e a ‘revisitação’ do dilema de Haldane.
Segundo a Pesquisa Datafolha, somente 8% dos brasileiros (a raça dos darwinistas ‘puros’) endossariam Haldane: “os seres vivos são produto de lentíssima evolução na qual variações fortuitas, mas vantajosas à sobrevivência e reprodução, se disseminam e acabam por dar origem a novas espécies, mais adaptadas a seu ambiente.” Ora, a evolução é tanto um processo lento e gradual ao longo de milhões de anos, bem como rápido — vapt, vupt evolução ocorrendo diante de nossos olhos. Um verdadeiro smorgasbord epistêmico. Self-service.
Embora eu tenha sido um péssimo aluno em matemática, eu fiquei sem entender porque é expressiva a parcela de 25% dos brasileiros. E aqui eu abro um parêntese e vou ser o advogado do Diabo dos criacionistas. A parcela é ‘expressiva’, embora identifique uma minoria, é porque ela descreve pessoas que ‘se mostram criacionistas, pois acreditam que os seres vivos tenham sido concebidos e materializados por Deus num único ato criativo.’ Eu penso que aqui, o ranço naturalista (posição subjetiva) falou mais alto do que a razão matemática.
Embora nos EUA estejam ‘enraizadas facções do cristianismo evangélico’ literalistas, e ‘os criacionistas são estimados em 45%’, o editorial da FSP afirmou não haver surpresa que naquele país somente ‘as implicações filosóficas e religiosas do darwinismo alcancem estridente controvérsia’, com ‘disputas judiciais renhidas a fim de preservar o ensino laico de contaminações religiosas’. E as razões seculares criticando a Darwin, não contam? Já adianto logo para a editoria jurídica da FSP: não existe nenhuma decisão da Suprema Corte Americana proibindo o ensino das evidências a favor e contra a teoria da evolução por razões estritamente seculares.
A versão atual da teoria da evolução de Darwin, o neodarwinismo, oops, Claudio Angelo prefere Síntese Evolutiva Moderna, foi considerada uma teoria morta po ninguém nada menos do que Stephen Jay Gould (mencionado cripticamente no fim do editorial) em artigo publicado em1980.
A FSP sabe, mas não repassa para seus leitores: nos Estados Unidos os cidadãos podem sim questionar nos Conselhos Educacionais e até na justiça aspectos educacionais, y otras cositas mais. Querer o ensino unilateral da teoria da evolução através da seleção natural sem críticas, quando já falamos na revisão teórica do darwinismo, é inaceitável em pleno século 21.
A pesquisa Datafolha no Brasil trouxe resultados parecidos com pesquisas realizadas na Europa com cenário variado: na Itália, Irlanda e Polônia, o índice de criacionistas se aproxima do brasileiro, sugerindo que, segundo o editorial da FSP, ‘nas nações de maioria católica essa questão não é relevante, talvez nem pertinente’porque ‘os católicos sempre estiveram à vontade com interpretações figuradas do evangelho’. É vero, mas pode ser o contrário. Especialmente levando-se em conta uma Europa completamente secularizada, mesmo nesses países de ‘maioria católica’como o Brasil.
Quando abordou o resultado da maioria dos brasileiros (59%) combinar a aceitação do processo evolutivo darwiniano com a fé na condução e supervisão divina, situadas num plano superior ao da natureza, o editorial da FSP, a la Macunaíma, afirmou que pode parecer inverossímil aos olhos dos ateus, mas essa conciliação de crenças não é absurda porque sugere nos evolucionistas teístas ‘um discernimento intuitivo de que questões de ciência não competem com questões de convicção religiosa’, pois `são campos que correspondem a dimensões diferentes da consciência humana’.
Gravura de Benett - Tubo de Ensaio
Ué, assopra e morde agora com o NOMA [Non-overlapping Magisteria, magistérios não sobrepostos] de Gould? Traduzindo em graúdos: ‘ado, ado, ado, cada um no seu quadrado!’
Para consolo da Nomenklatura científica, ‘o darwinismo dito "puro" tende a crescer conforme aumenta a educação formal’, mas aqui cabe a pergunta causticante deste blogger: Educação formal ou doutrinação formal? Se Darwin é ensinado acriticamente, não causa nenhuma surpresa que os que foram assim ‘doutrinados’ desde o ensino fundamental até à universidade reflitam esse darwinismo ‘puro’. Será que se as evidências a favor e contra a evolução fizesse parte da abordagem nos livros didáticos de Biologia e nas aulas de ciência, o darwinismo ainda seria assim tão ‘puro’? Duvido, e a Nomenklatura científica treme na base e perde o sono só de pensar nesta possibilidade maquiavélica contra o homem que teve a maior ideia que toda a humanidade já teve.
Correndo o risco de ter uma ‘fatwa’ emitida contra si, o editor contrastou os índices mais altos de darwinismo ‘puro’ na Europa (países escandinavos) com a Turquia (mais da metade da população criacionista) supondo que nos ‘países de predomínio islâmico essa marca se repita ou seja suplantada, pois o Islã tende a adotar uma visão mágica e literal do advento do homem na Terra’. Sugiro ao editor procurar asilo rapidamente em algum país escandinavo!
No final, o editorial da FSP, fiel e infiel na sua relação incestuosa com a Nomenklatura científica, enveredou para a defesa do ‘discurso único’ sobre a teoria da evolução e do credo religioso-epistêmico do crioulo doido tupiniquim: ‘O levantamento Datafolha desencoraja certa tendência a importar uma polêmica que pode fazer sentido nos EUA, mas que não se sustenta em nossa realidade cultural.’ Razão? O desafio brasileiro de ‘reunir a rua e a casa, a lei e a família, o sobrenatural e o prosaico’, identificado há algumas décadas pelo antropólogo Roberto Da Matta, parece que na questão religião e darwinismo, ‘esse sincretismo à brasileira já vigora.’
Que o sincretismo a la Macunaíma já vigora no Brasil não se discute. O que é discutível e deplorável no editorial da FSP é a sugestão de que os dados ‘desencoraja certa tendência a importar uma polêmica que pode fazer sentido nos EUA, mas que não se sustenta em nossa realidade cultural.’ Nada mais completamente falso. Tanto nos EUA como no Brasil, esta polêmica tem tudo a ver com a ciência, apesar do ‘ruído religioso’. Se existem críticos religiosos de Darwin, muitos deles encontraram e encontram essas críticas e argumentos em pesquisas e artigos de cientistas que afirmaram e afirmam desde 1859 que Darwin não fecha as contas em um contexto de justificação teórica, que a teoria da evolução através da seleção natural é ciência capenga, y otras cositas mais.
Os verdadeiros culpados por isso são os cientistas, pois, felizmente, a ciência é a busca pela verdade, e foram eles que fizeram a ciência da falsificação das hipóteses transformistas de Darwin, que foi encontrado e demonstrado correto e errado: acertou no varejo (microevolução) e errou no atacado (macroevolução). Não querer que este debate público prospere e ocorra no Brasil é estranho. Mui estranho...
Ah, será que a Pesquisa Datafolha e o editorial da FSP foram 'factoides' criados para esvaziar o III Simpósio Internacional “Darwinismo Hoje” na Universidade Presbiteriana Mackenzie agora em abril? Não, mil vezes não. É muita 'teoria de conspiração', mas vai que é vero? Como historiador de ciência em formação, eu não me esqueço do modus operandi do X Club, de Huxley, Hooker et al...
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