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Dízimo Bíblico - Origem e propósito
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11022012
Dízimo Bíblico - Origem e propósito
O dízimo, como verdade bíblica, por mais que pareça hoje um tema comum (debate-se acerca de seu uso e da forma como é solicitado pelas diversas denominações), já foi alvo de esquecimento e, ainda hoje, é objeto de distorções quanto à sua validade, finalidade e aplicação.
Não podemos esquecer que: “Deus não tem mudado; o dízimo ainda deve ser usado para o sustento do ministério. O começo da Obra em vários campos requer mais eficácia ministerial do que a que temos agora, e tem que haver fundos na tesouraria”.
Lamentavelmente, como todas as doutrinas da Escritura, o dízimo também está sendo atacado, mesmo no seio da igreja, sendo tais ataques ajuntados a uma velada ou explícita resistência à organização devido a eventuais erros que possam estar sendo cometidos em seu seio ou mesmo por injustificada suspeita de as coisas não estarem sendo bem dirigidas. Questionam-se os motivos dos que pedem para a obra e muitas vezes alimentam-se sentimentos de que se está sendo enganado ou defraudado, como resultado perde-se a noção de uma sagrada reserva, e é prejudicado o avanço da obra que deve ir até os confins da Terra.
Pretende-se apenas revisar, aqui, sucintamente, os ensinos bíblicos de uma perspectiva adventista. Neste estudo será abordado, também, o assunto das ofertas, uma vez que está ligado ao tema principal deste estudo (Ml 3:8).
O Antigo Testamento faz referência ao dízimo 35 vezes e o Novo Testamento dez vezes. Tais passagens serão citadas e examinadas na mediada das possibilidades deste artigo, mais à frente.
Vale a pena lembrar a advertência aos pastores e à igreja:
Alguns deixam de educar o povo a cumprir com todo o seu dever. Pregam parte de nossa fé que não cria oposição ou desagrada aos ouvintes, mas não declaram toda a verdade. O povo aprecia-lhes a pregação, mas há falta de espiritualidade porque os reclamos do Senhor não são atendidos. Seu povo não lhe dá em dízimos e ofertas o que lhe pertence. Esse roubo a Deus, praticado tanto pelos ricos como pelos pobres, traz trevas às igrejas; e o ministro que com elas trabalha, e não lhes mostra a vontade de Deus claramente revelada, é condenado com o povo, por negligenciar seu dever.
Tal declaração, a meu ver, é um motivo bastante significativo, além dos textos bíblicos, para um contínuo esforço denominacional, que inclua maior compreensão, melhor emprego e, finalmente, mais fidelidade nesta área.
A Teologia do Dízimo nas Escrituras
Reconhecendo a autoridade do dízimo em relação a lei mosaica (Gn 14:20; 28:22; Hb 7:5-10), pode ser entendido que o sistema é independente do sacerdócio levítico, reconhecido e praticado mesmo por Abraão, o maior dos patriarcas, o pai da fé. Aliás, fé é o elemento chave, para a fidelidade a Deus, especialmente neste assunto. A fidelidade requer confiança total na promessa de Deus (Ml 3:10-13).
Foi somente após a saída dos israelitas do Egito que o dízimo foi regulamentado para o sistema levítico. Ele era dado ao levita, devido a não ter “herança na terra”, isto é, ele vivia exclusivamente para o serviço religioso e isso lhe dava direito a todos os dízimos (Lv 27:30-34).
Como oferta para o ministério o dízimo pertence realmente a Deus, não deve ser trocado sob pena de multa de um quinto, ou seja, vinte por cento, e em se tratando de dízimos de animais a sua troca implicara na perda do trocado, isto é, multa de cem por cento, para quem tentasse obter lucro trocando um dízimo gordo por uma substituição mais magra. A lei fazia clara proibição, que desestimulava as artimanhas do coração egoísta enfatizando: “não esquadrinharás entre o bom e o ruim.” Sua entrega deveria ser feita somente aos levitas, que atuavam como sacerdotes e, que dariam à família de Arão, o dízimo dos dízimos (Nm 18:20-26; Ne 10:37-38; 12:44; 13:5-12).
Sendo anterior a Moisés e proclamando o princípio de que Deus é o verdadeiro dono de tudo, exercendo um convite a liberdade e denunciando o coração egoísta e avarento, nutrindo a obra de Deus com dádivas altruístas de um coração convertido e liberal, fazendo sentido as palavras realmente inspiradas:
“O sistema especial do dízimo baseia-se em um princípio tão duradouro como a lei de Deus”.
Reivindicando ter recebido luz direta de Deus, Ellen G. White repudia a ação de um homem, entre outros, que proclamava a não devolução do dízimo. Suas palavras ainda definem o assunto como “terra santa” e apela com sensibilidade:
“Como ousa então o homem até mesmo pensar em seu coração que uma sugestão para reter o dízimo e ofertas vem do Senhor? Onde, meu irmão, vos desviastes do caminho? Oh, ponde vossos pés de novo no caminho reto!”
O Dízimo no Antigo Testamento
Antes que teçamos maiores comentários, o esboço a seguir ajudará a compreender as rendas do Templo e suas finalidades:
1) Para os sacerdotes (levitas da família de Arão), conforme Números 18:9-26 e Levítico 5:15-7:35 destacamos:
a) Todas as ofertas que não eram queimadas.
b) Toda coisa consagrada a Deus por voto.
c) Todas as primícias.
d) Todos os primogênitos dos animais.
e) O dízimo dos dízimos dado pelos levitas.
2) Para os levitas (Nm 18:21-32) – Os dízimos de tudo em Israel.
3) Para os pobres destinava-se um segundo dízimo. Dt 12, 14, 26. Sobre esse segundo dízimo falaremos mais adiante. Havia também outras provisões mosaicas destinadas a proteger os desafortunados como a respiga e o ano sabático (Dt 24:19-10; 25:9-10), mas este não é o assunto do presente estudo.
4) Para a construção, reforma e manutenção do Templo.
a) O imposto anual.
b) O dinheiro do resgate das pessoas.
c) Coleta feita pelos sacerdotes.
d) Ofertas voluntárias trazidas ao Templo.
Mesmo respeitando os limites deste trabalho, nos perguntamos como foram administrados os dízimos e ofertas em Israel?
Os exemplos seguintes nos ajudarão a compreender alguns aspectos da questão:
Sob Joás. A reforma de Joás, (cerca de 835 a 796 a.C.) foi uma reforma do Templo e dos seus serviços. Essa empreitada de arrecadação de fundos, para usar uma linguagem bem atual, foi encomendada pelo rei aos sacerdotes. Estes deveriam sair pelas cidades de Judá e levantar dinheiro de todo Israel com o objetivo de reparar “a casa do vosso Deus de ano em ano” (2Cr 24:1-14). Também cobrou ação dos levitas quanto ao “imposto de Moisés” que havia sido instituído para esse fim (v.6). Após haverem conclamado a nação, os levitas receberam esse dinheiro dos israelitas até que a obra foi concluída (vv. 9-10). Esse imposto anual, foi estabelecido no deserto com o objetivo específico de manter e reformar o Templo e correspondia a metade de um siclo “segundo o siclo do santuário” (Êx 30:11-16).
O dicionário diz que o siclo era uma moeda dos judeus, de prata pura e que pesava seis gramas. O shekel ou siclo, era uma moeda de prata pura (meio siclo) que cada um pagava para os gastos de “reparação do Templo e para os sacrifícios, para o perdão do povo. O prazo do pagamento era do dia primeiro ao dia quinze do mês de Adar. Este costume continua até nossos dias,...”
Todo judeu adulto era obrigado a recolher anualmente este imposto e, especificamente nesta época de Joás, estava sendo depositado numa arca de ofertas, no Templo (2Cr 24:8).
Além do imposto do Templo, Joás usou para as despesas da reforma o dinheiro do resgate das pessoas (Lv 27:1-15), as ofertas voluntárias (2Rs 12:4). E a arrecadação feita pelos sacerdotes (2Rs 12:5). Os dízimos continuavam exclusivos para o sacerdócio.
Sob Ezequias. Mentor de uma reforma espiritual que chamava todo o povo para um reavivamento, o rei Ezequias (729 a 686 a.C.) tomou medidas financeiras para restaurar à atividade o Santuário (2Cr 31:2-21). O rei custearia as cerimônias diárias da manhã e da tarde, dos sábados, luas novas e festas fixas, conforme a lei do Senhor (v. 3 e Nm 28:1-29). O povo contribuiria com a parte devida aos sacerdotes e levitas, que eram os dízimos e as ofertas (v. 4-6 e Nm 18) e o fez com tal abundância que foi necessário preparar novos depósitos (v.11), e ali recolher fielmente as ofertas, os dízimos e as coisas consagradas (v. 12).
Havia dois grupos encarregados de administrar as entradas, em separado:
(1) Um intendente e sua equipe para os dízimos e porções dos sacerdotes nominalmente. Recebiam o pagamento apenas os que estavam oficialmente registrados como ministros de Deus (vv. 17-19). Eles não recebiam os dízimos diretamente dos adoradores, mas da tesouraria centralizada que coordenava toda a distribuição das porções dos dízimos e rendas dos que, não tendo outra atividade, viviam somente para o serviço religioso da obra do Senhor (vv. 14, 15 e 19). As porções eram para todos os levitas, sem discriminação.
(2) Outro intendente levita, Coré, e a sua equipe controlava as ofertas e sua distribuição aos que serviam no Templo em seus turnos (vv. 14-16).
A reforma de Ezequias obedeceu às diretrizes que se encontravam nas leis e mandamentos de Deus (v.21). Não eram idéias de organização originais do rei, mas um retorno ao modelo divino abandonado durante a apostasia. Deus as aprovou e abençoou, uma vez que foram declaradas boas, retas e verdadeiras (vv. 20 e 21). Os dízimos continuavam exclusivos para o sacerdócio.
Sob Josias. A reforma posterior, do rei Josias (640 a 609 a.C.), seguiu o mesmo padrão de Joás e Ezequias. As ofertas voluntárias e o imposto do Templo continuavam ainda a serem depositadas na caixa à porta do Santuário (2Rs 22:1-7; 2Cr 24:8-10; 31:14).
Sob Neemias. Depois de recolhidos, em produtos diversos, os dízimos e as ofertas, eram levados a depósitos próprios para cada dádiva, como menciona Neemias (12:44). Esse procedimento chama a atenção, uma vez que tratava-se de uma reforma espiritual que ocorria após o retorno do cativeiro (ca. 444 a.C.). Tal reforma foi seguida de um apelo à devolução das porções prescritas na lei e envolviam ofertas, primícias, dízimos e outras de acordo com a Torah. Tendo determinado depósitos específicos para cada oferta, afim de não misturar entradas que tinham finalidades diferentes, Neemias também elegeu tesoureiros, centralizou a entrega dos recursos no Santuário de onde se distribuíam as porções aos levitas e sacerdotes, cada um em sua função. É sintomática a preferência por um centro recebedor e uma fiel equipe de sacerdotes que fizesse a distribuição “a seus irmãos” ficando uma equipe em Jerusalém para os sacerdotes e outras nas cidades dos levitas (Ne 12:44-47; 13:10-13).
O ministério de Malaquias. Em Malaquias 3:8-10 (ca. 400 a.C.), o profeta refere-se a essa Casa do Tesouro do Templo, com a sua administração e organização, na qual os dízimos não eram misturados com as ofertas e coisas consagradas, mas tinham seu controle por um corpo de levitas nomeado especialmente para receber e dar as porções aos sacerdotes. A ênfase de Malaquias é a falta de bênçãos em virtude de não devolverem os dízimos fielmente, pois deveriam trazê-lo a Jerusalém sob a supervisão dos sacerdotes (dízimo dos dízimos e ofertas especiais) e manter a porção dos levitas em suas cidades para que os tesoureiros, também levitas, fizessem a distribuição conforme fosse necessário.
Segundo McConville, mencionado por E. E Carpenter, já citado acima, Neemias representa a mais antiga tradição acerca do uso do dízimo e deriva de Deuteronômio e Números.
Não podemos esclarecer, evidentemente, todos os detalhes referentes ao uso do dízimo levítico em Israel, mas podemos, com razoável segurança entender que esse dízimo era a décima parte das rendas do adorador, obrigatória, que não podia ser trocada ou resgatada, no todo ou em parte, era consagrada ao ministério, não podendo ser utilizada para nenhuma outra finalidade ou serviço, mesmo do Santuário, e que sua administração não era feita pelos sacerdotes individualmente e nem pelo adorador, mas por uma equipe designada dentre os próprios levitas; além do mais, é dito pertencer a Deus e por isso deve ser devolvida (Lv 27; Ml 3:8-10). Por outro lado, quanto às ofertas, elas pertencem ao homem (Dt 16:10), o critério de quanto dar é do homem (Dt 16:17), podem ser usadas para várias finalidades (Êx 30:12, 13; 2Cr 31:14; 24:6, 9; Ne 10:32), por isso damos. Foi a liberalidade e obediência dos israelitas ao princípio desses usos adequados nas diversas ofertas que possibilitou toda a construção, manutenção e reformas do Templo em várias épocas sem lançar mãos do dízimo, conforme Deus prescrevera.
O Dízimo no Novo Testamento
A palavra dízimo não é usada de forma direta nas instruções à igreja sobre o assunto, no entanto é bom lembrar que a omissão não invalida a doutrina e nem o Novo Testamento se destinava a ser o instrumento único que vai estabelecer as doutrinas válidas da igreja. Uma doutrina não precisa ser repetida nos escritos neotestamentários para ser validada. Aliás, o Antigo Testamento eram as Escrituras usadas pelos apóstolos e na qual respaldavam seus ensinos. Encontramos, porém, no Novo Testamento, o ensino do dízimo abordado de outra forma, nos argumentos em favor de uma visão mais exaltada do ministério cristão e seu direito à justa remuneração. Como o dízimo subsistia, anteriormente, sem a lei levítica, como já foi visto, persevera após ela.
Na epístola aos Hebreus, capítulo sete, menciona-se a exclusividade dos levítas para recolher o dízimo dentro do sistema Mosáico. O autor de Hebreus aproveita a oportunidade para chamar a atenção de que em Abraão (antepassado dos levítas) Levi, havia dado os dízimos para um sacerdócio superior, instituído por Deus. Mequizedeque é representante do sacerdócio de Cristo, superior ao aarônico e levita. Aqui, mais uma vez, o dízimo é mencionado em sua anterioridade ao sistema levítico e é declarada a sua natureza sagrada e exclusiva para o ministério, servindo inclusive, para identificar a importância do ministério não levítico de Mequizedeque, pois que esse recebeu dízimos do próprio Abraão. Embora não seja o propósito direto da passagem em questão, somos levados a pensar, se, os dízimos dados a Mequizedeque, não apontam para o princípio da manutenção sacerdotal que passa por Moisés, chega ao NT e permanece até os dias atuais, lembrando que o atual ministério é uma extensão, na Terra, daquele que está sendo desenvolvido pelo Salvador no Santuário do Céu. Não é o ministério da igreja, por meio dos que “vivem do evangelho”, uma extensão do ministério salvador de Cristo?
O fariseu, estrito cumpridor da Lei, não esquecia de devolver seu dízimo fiel, mesmo que fosse “do endro e do cominho” (Lc 18:12). Embora sua negligência da justiça, misericórdia e fé merecesse a reprovação de Jesus, o Salvador não deixou passar a oportunidade para reiterar o princípio da fidelidade nos dízimos: “fazei estas coisas sem omitir aquelas”. Ou seja, “não use o dízimo para negligenciar a misericórdia, não use a misericórdia para negligenciar o dízimo” (Lc 11:42; Mt 23:23). Uma advertência do próprio Salvador contra a religião unilateral.
Interessante notar que, os fariseus acusavam Jesus de muitas coisas, porém jamais de não ser dizimista ou pregar contra esse sistema. Esse aspecto se torna mais relevante quando é lembrado que o Salvador condenava a avareza dos fariseus (Mt 23:14, 16, 17; Lc 16:14), descritos nos Evangelhos como uma elite cultural e religiosa da época (Mt 23:2). Além disso, suas disputas pelos cargos sacerdotais e as corrupções decorrentes não foram suficientes para impedir de Jesus de fazer o apelo pela lealdade do dízimo: “fazei estas coisas”.
A defesa de Paulo para a remuneração dos ministros do evangelho, tem sua base argumentativa nos textos do AT que se referem às entradas que mantinham os sacerdotes (1Co 9:6-14). Segundo ele:
1) Havia apóstolos que não trabalhavam secularmente (v. 6).
2) Pagar ministros era uma prescrição da lei (v. 8 e 9), e esta o fazia pelo sistema de dízimos (Nm 18).
3) O verso 13, diga-se, é uma referência direta do dízimo. Pois baseia seu apelo para o pagamento de ministros da igreja no direito dos sacerdotes e levitas que tinham seu sustento garantido pelo dízimo, a principal de suas entradas. Afinal não eram os sacerdotes e levitas os únicos que se podiam achegar ao altar e prestar o serviço sagrado no Templo (Nm 18:20-26)?
4) Essa parte, devida aos sacerdotes, é um direito do qual já estavam fazendo uso (vv. 10 e 12).
5) O mesmo sistema deve ser usado para os ministros do evangelho (v. 14).
6) Um direito do qual Paulo abriu mão (1 Co 9:12, 15), entre os coríntios (2Co 11:7), mas por causa da contestação do seu apostolado (2Co 11:5, 6) e para não dar ocasião aos falsos apóstolos (2Co 11:8 a 13), no entanto usou desse direito aceitando salário de outras igrejas (2Co 11:8).
7) Esse é um direito tão natural, segundo o apóstolo, como de alguém que planta uma vinha (1Co 9:7; Dt 20:6) e dela cuida (Pv 27:18).
Além disso, pagar os pastores é justo, especialmente aos que servem na pregação e no ensino (1Tm 5:17-18). Deve ser feito de tal maneira que não desperte ganância (1Pe 5:2). Afinal, o objetivo é que o pastor, pago pela igreja, não se embarace com as coisas desta vida e assim, sirva bem à causa de Deus (2Tm 2:4).
Vê-se pois, que, mesmo antes de Moisés, o sistema de manutenção dos ministros de Deus era basicamente pelo dízimo; assim foi durante a teocracia em Israel para a manutenção dos levitas e sacerdotes do Templo de Jerusalém; foi sancionado por Jesus; a manutenção dos ministros do evangelho foi defendida por Paulo usando a linguagem e as idéias do sacerdócio levítico do AT; e, uma vez que a Bíblia não apresenta nenhum outro sistema, parece lógico concluir que esse é o plano que deve ser usado hoje em dia na igreja. Qualquer outro sistema assume a condição de uma criação meramente humana tentando substituir o plano de Deus.
O Segundo Dízimo
Além do (a) dízimo levítico (Nm 18; Lv 27), as hipóteses de estudiosos defendem ora (b) dois dízimos (um para a adoração em família e os pobres e o outro para os levitas e sacerdotes), ora (c) três dízimos (levitas, pobres e para a família, elevando os donativos dos israelitas a um montante fixo de 30% de suas rendas sem contar as doações especiais já mencionadas neste trabalho).
Há referência também ao dízimo do rei, um sistema de impostos, que não será discutido aqui visto não envolver o tema deste estudo.
As passagens em contraste com Números e Levítico acima mencionadas são Deuteronômio 12:6-18; 14:22-28; 26:12-14. Vejamos:
1) Deuteronômio 12:5-18. Promovendo a adoração em família. A ênfase está no uso de uma décima parte das rendas para a adoração em família. Os servos e o levita estariam presentes como participantes. O lugar mencionado nesta passagem é uma referência ao local onde estivesse o tabernáculo, Templo israelita. O levita não recebia esse dízimo pois era apenas um convidado ao banquete religioso da família.
2) Deuteronômio 14:22-28. Lembrando dos pobres, viúvas e órfãos. Basicamente o mesmo conteúdo da passagem anterior com algumas informações adicionais. O banquete seria realizado a cada terceiro ano, evidentemente dentro do círculo sabático, isto é, ao terceiro e sexto anos. Caso o adorador morasse longe e fosse dificultoso transportá-lo , esse dízimo poderia ser vendido, se fosse de produtos agro-pecuários, e trocado por dinheiro (o que não era permitido fazer com o dízimo dos sacerdotes), e levado ao local do templo e no lugar determinado ele faria a festa. Nos outros anos o banquete deveria ser realizado em casa e a lista de convidados, desta vez, seria aumentada estendendo-se aos pobres, viúvas e órfãos. Mais uma vez é o adorador quem faz uso desse dízimo ao seu bel-prazer e o levita não o recebe, ele é, novamente apenas mais um convidado, como os demais, visto não ter “herança na terra”.
Será visto em seguida alguns comentaristas sobre Dt 14:22-28:
Diz Adam Clark:
Trata-se do segundo dízimo que eles deviam comer, v. 23. Havia um primeiro dízimo que era dado aos levitas do qual pagavam a décima parte aos sacerdotes. Nm 18:24 a 28; Ne 10:37 a 38.
Então, do restante, o proprietário separava um segundo dízimo, que ele comia perante o Senhor no primeiro e no segundo ano; e no terceiro ano era usado para os levitas e os pobres, Dt 14:28 a 29. No quarto e quinto anos ele era comido novamente pelos proprietários, e no sexto era dado aos pobres. O sétimo ano era um Sábado, para a terra, e então todas as coisas eram comuns.
Diz o The New Bible Commentary:
Assim é para ser entendido do segundo dízimo, que parece ser o mesmo dízimo do terceiro ano mencionado logo abaixo, v. 28 e Dt 26:12, o qual pode ser visto acima no capítulo 12:17 (...) deste dízimo é dito ser um ato do povo, Dt 26:12, e os levitas não são mencionados em ambos os lugares como recebedores, mas apenas como participantes juntamente com os proprietários...
Matthew Poole:
Quando Moisés falou estas palavras o princípio do dízimo já era bem aceito em Israel. (...) Para assinalar a sacralidade do todo, um percentual definitivo era colocado de lado e dedicado no Santuário. Este é o chamado ‘segundo dízimo’, em contraste com o dízimo dos produtos dados para manter os levitas (ver Nm 18:26 a 28)...
3) Deuteronômio 26:12-14.
Nesta passagem tem-se a última referência sobre este dízimo especial ou segundo dízimo, sendo que a ênfase recai no seu uso a cada terceiro ano. Mais uma vez o adorador usa e administra este dízimo como quer, sendo o pobre e o levita apenas convidados para a festa. Mais uma vez o levita não o recebe, apenas dele participa.
Pode-se concluir, pois, com razoável segurança, que as três passagens dos capítulos 12, 14 e 26 de Deuteronômio se completam. A conclusão, que pode ser tirada por uma atenta leitura, é claramente compartilhada por Ellen G. White:
A fim de promover a reunião do povo para o serviço religioso, bem como para se fazerem provisões para os pobres, exigia-se um segundo dízimo de todo o lucro. Com relação ao primeiro dízimo, declarou o Senhor: ‘Aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel’. Nm 18:21.
Mas em relação ao segundo ele ordenou: ‘Perante ao Senhor teu Deus, no lugar que escolher para fazer ali habitar o seu nome, comereis os dízimos do teu grão, do teu mosto, e do teu azeite, e o primogênito das tuas vacas e das tuas ovelhas: para que aprendam a temer o Senhor teu Deus todos os dias. Deuteronômio 14:23 e 29; 16:11 a 14. Esse dízimo, ou o seu equivalente em dinheiro, deviam por dois anos trazer ao lugar em que estava estabelecido o Santuário.
Depois de apresentarem uma oferta de agradecimento a Deus, e uma especificada porção ao sacerdote, os ofertantes deviam fazer uso do que restava para uma festa religiosa, da qual deviam participar os levitas, os estrangeiros, os órfãos e as viúvas. Assim tomavam-se providências para as ações de graças e festas, nas solenidades anuais, e o povo era trazido à associação com os sacerdotes e levitas, para que pudessem receber instrução e animação no serviço de Deus.
A cada terceiro ano, entretanto, este segundo dízimo devia ser usado em casa, hospedando os levitas e os pobres, conforme Moisés dissera: ‘Para que comam dentro das tuas portas, e se fartem’. Dt 26:12. Este dízimo proveria um fundo para fins de caridade e hospitalidade.
Apesar de haver comentaristas que defendem a existência de duas legislações: uma para o povo quando vagueava no deserto, em Nm 18, e outra para o povo já estabelecido em Canaã, em Dt 12, 14, e 26, conforme já mencionado anteriormente, a Enciclopédia judaica comunga com o pensamento de um segundo dízimo, com aplicações diferentes, nos termos apresentados, basicamente por Ellen G. White:
Maaser Sheni, heb., 2º. Dízimo. Oitavo tratado (7º em alguns códigos) na ordem mishnaica de Zeraim, contendo cinco capítulos. (...) Trata, principalmente, dos dízimos comidos em Jerusalém (Dt 14:22 a 27) e a maneira de resgatá-los em dinheiro.
Declara ainda:
Maaserot ou Maaser Rishon (em heb., ‘dízimo’ ou ‘1º. dízimo’ (...). Trata do dízimo dado ao levita (Nm. 18:21).
Maaser (dízimo). Uma décima parte da produção. Esta costumava ser separada como oferenda religiosa. Esse costume tem origem antiga, como por exemplo, Abraão dando o dízimo ‘um décimo de tudo’ a Melquizedeque (Gn 14:18 a 20). A lei judaica relaciona vários dízimos obrigatórios. (1) Primeiro dízimo (Nm 18:24) dado aos levitas, depois da separação da terumah (oferenda retirada) para os sacerdotes; no tempo do segundo Templo este dízimo também era dado aos sacerdotes.
A Mishnah em seu tratado Maaserot trata desse dízimo.
(2) Segundo dízimo (Lv 27:30 a 31; Dt 14:22 a 26), isto é um décimo adicional tomado depois do 1º. dízimo. Este era consumido pelo próprio dono em Jerusalém. Usava-se apenas durante os 1º., 2º., 4º., e 5º. ano do ciclo sabático. Os pormenores estão no tratado do Maaser Sheni.
(3) Dízimo dos pobres (Dt 14:28 a 29 e 26:12) dado aos pobres e substituindo o segundo dízimo no 3º. e 6º. ano do ciclo sabático.
(4) Dízimo dos animais (Lv 27:32) escolhidos na contagem feita três vezes no ano e oferecidos em sacrifício pelo dono (Veja tratado Bekhorot). Os levitas tinham que pagar um dízimo que eles próprios recebiam (Núm. 18:26).
O sistema do primeiro dízimo subsiste nas Escrituras como parte do plano divino para a manutenção do ministério. Como já foi visto, tal prática antecede a Moisés e subsistia antes do Santuário e do próprio Israel. Não acontece o mesmo com o segundo dízimo. Ele está intimamente ligado (conforme Dt 12, 14, 26) ao sabático que ocorria de sete em sete anos.
A tabela abaixo é ilustrativa das diferenças entre os diversos dízimos (foram incluídos aqui os impostos reais, chamados de dízimos):
TABELA SUMÁRIA DOS DÍZIMOS
Conclusão
Nessa questão é preciso lembrar que toda uma comunidade, um verdadeiro exército, deveria ser mantido pelo sistema de dízimo, sob pena de abandono do seu ministério para cuidar da sobrevivência. A dedicação exclusiva era indispensável e precisaria ser mantida com um sistema consistente e esse sistema é o de um dízimo exclusivo para os levitas e sacerdotes, daí a necessidade de um constante reavivamento nessa área. Basta calcular que a condição financeira dos levitas seria, aproximadamente, nesse sistema, a média da situação de todas as demais tribos, sem implicar necessariamente, em enriquecimento.
A idéia do dízimo, como interpretada a partir de Deuteronômio, sendo usada para os levitas, pobres e outros carentes, misturadamente, encontra-se isolada na Escritura, que postula antes e depois, um dízimo exclusivo para os levitas e sacerdotes, e outro para a adoração em família e para os pobres (um segundo dízimo). Além disso, parece que a conseqüência natural dessa interpretação (um único dízimo não exclusivo para os levitas) leva a tribo de Levi ao empobrecimento, deixando-a ao nível dos pobres mendicantes. Também não teria sentido apelar para trazer os “dízimos à casa do Tesouro” (Ml 3:8-10), ao Templo em Jerusalém, com sua tesouraria específica (Ne 12:44), se os dízimos devessem ser usados pelos adoradores, desde a época deuteronômica, como querem alguns. Como explicar o conflito em Números 18 versus Deuteronômio 12, 14 e 26? As soluções, de qualquer modo, frente à história posterior de Israel, resultam na final permanência de um único dízimo exclusivo para os sacerdotes. Como dizer que deveriam os levitas receber da tesouraria do Templo, os dízimos arrecadados das cidades, conforme a lei prescrevia (2Cr 31:2-21)? Então, não eram entregues diretamente aos levitas e nem usados pelo adorador. Se já houvessem (os levítas) recebido diretamente do adorador, ou se estes os usasse como bem quisesse, para que, então, tesouraria de dízimos no Templo? Ou o pensamento deuteronômico trata de um segundo dízimo, conforme vimos, ou então, esta é uma questão irreconciliável, perdida no mundo das hipóteses.
Conclui-se, portanto, pela idéia de que na Bíblia aparecem dois dízimos diferentes e separados. Um destinado, anteriormente, aos levitas e sacerdotes e, hoje, ao pagamento de ministros do evangelho, e o outro destinado à adoração em família e atendimento aos necessitados. Este segundo dízimo, entre outras doações do sistema mosaico, apresenta-se como um referencial básico para as ofertas que, segundo Paulo, devem ser dadas “não com tristeza nem por necessidade” mas com “alegria” (2Co 9:6 a 12), lembrando a alegria que, segundo Deuteronômio deveria acompanhar a sua entrega (Dt 12:6, 7, 12, 18; 14:26; 26:14), a qual, enfatiza, não deveria ser feita com “tristeza” (Dt 26:14).
Um reavivamento e retorno ao modelo bíblico de liberalidade e administração fiel do fundo sagrado, seja por parte de nossas instituições ou individualmente, mediante a instrução pastoral, ainda se faz necessário em nossos dias como o foi, algumas vezes, no passado.
Num mundo onde a corrida pelo dinheiro tomou o lugar do amor a Deus e à sua obra no coração de muitos professos cristãos, certamente, esse exemplo, dos fiéis israelitas às determinações divinas, é uma lição de liberalidade, nos dízimos e nas ofertas, digna de ser imitada hoje pelos verdadeiros adoradores, que amam mais a Deus do que a Mamom, e querem preparar o mundo para a breve volta do Senhor Jesus.
Demóstenes Neves da Silva
Não podemos esquecer que: “Deus não tem mudado; o dízimo ainda deve ser usado para o sustento do ministério. O começo da Obra em vários campos requer mais eficácia ministerial do que a que temos agora, e tem que haver fundos na tesouraria”.
Lamentavelmente, como todas as doutrinas da Escritura, o dízimo também está sendo atacado, mesmo no seio da igreja, sendo tais ataques ajuntados a uma velada ou explícita resistência à organização devido a eventuais erros que possam estar sendo cometidos em seu seio ou mesmo por injustificada suspeita de as coisas não estarem sendo bem dirigidas. Questionam-se os motivos dos que pedem para a obra e muitas vezes alimentam-se sentimentos de que se está sendo enganado ou defraudado, como resultado perde-se a noção de uma sagrada reserva, e é prejudicado o avanço da obra que deve ir até os confins da Terra.
Pretende-se apenas revisar, aqui, sucintamente, os ensinos bíblicos de uma perspectiva adventista. Neste estudo será abordado, também, o assunto das ofertas, uma vez que está ligado ao tema principal deste estudo (Ml 3:8).
O Antigo Testamento faz referência ao dízimo 35 vezes e o Novo Testamento dez vezes. Tais passagens serão citadas e examinadas na mediada das possibilidades deste artigo, mais à frente.
Vale a pena lembrar a advertência aos pastores e à igreja:
Alguns deixam de educar o povo a cumprir com todo o seu dever. Pregam parte de nossa fé que não cria oposição ou desagrada aos ouvintes, mas não declaram toda a verdade. O povo aprecia-lhes a pregação, mas há falta de espiritualidade porque os reclamos do Senhor não são atendidos. Seu povo não lhe dá em dízimos e ofertas o que lhe pertence. Esse roubo a Deus, praticado tanto pelos ricos como pelos pobres, traz trevas às igrejas; e o ministro que com elas trabalha, e não lhes mostra a vontade de Deus claramente revelada, é condenado com o povo, por negligenciar seu dever.
Tal declaração, a meu ver, é um motivo bastante significativo, além dos textos bíblicos, para um contínuo esforço denominacional, que inclua maior compreensão, melhor emprego e, finalmente, mais fidelidade nesta área.
A Teologia do Dízimo nas Escrituras
Reconhecendo a autoridade do dízimo em relação a lei mosaica (Gn 14:20; 28:22; Hb 7:5-10), pode ser entendido que o sistema é independente do sacerdócio levítico, reconhecido e praticado mesmo por Abraão, o maior dos patriarcas, o pai da fé. Aliás, fé é o elemento chave, para a fidelidade a Deus, especialmente neste assunto. A fidelidade requer confiança total na promessa de Deus (Ml 3:10-13).
Foi somente após a saída dos israelitas do Egito que o dízimo foi regulamentado para o sistema levítico. Ele era dado ao levita, devido a não ter “herança na terra”, isto é, ele vivia exclusivamente para o serviço religioso e isso lhe dava direito a todos os dízimos (Lv 27:30-34).
Como oferta para o ministério o dízimo pertence realmente a Deus, não deve ser trocado sob pena de multa de um quinto, ou seja, vinte por cento, e em se tratando de dízimos de animais a sua troca implicara na perda do trocado, isto é, multa de cem por cento, para quem tentasse obter lucro trocando um dízimo gordo por uma substituição mais magra. A lei fazia clara proibição, que desestimulava as artimanhas do coração egoísta enfatizando: “não esquadrinharás entre o bom e o ruim.” Sua entrega deveria ser feita somente aos levitas, que atuavam como sacerdotes e, que dariam à família de Arão, o dízimo dos dízimos (Nm 18:20-26; Ne 10:37-38; 12:44; 13:5-12).
Sendo anterior a Moisés e proclamando o princípio de que Deus é o verdadeiro dono de tudo, exercendo um convite a liberdade e denunciando o coração egoísta e avarento, nutrindo a obra de Deus com dádivas altruístas de um coração convertido e liberal, fazendo sentido as palavras realmente inspiradas:
“O sistema especial do dízimo baseia-se em um princípio tão duradouro como a lei de Deus”.
Reivindicando ter recebido luz direta de Deus, Ellen G. White repudia a ação de um homem, entre outros, que proclamava a não devolução do dízimo. Suas palavras ainda definem o assunto como “terra santa” e apela com sensibilidade:
“Como ousa então o homem até mesmo pensar em seu coração que uma sugestão para reter o dízimo e ofertas vem do Senhor? Onde, meu irmão, vos desviastes do caminho? Oh, ponde vossos pés de novo no caminho reto!”
O Dízimo no Antigo Testamento
Antes que teçamos maiores comentários, o esboço a seguir ajudará a compreender as rendas do Templo e suas finalidades:
1) Para os sacerdotes (levitas da família de Arão), conforme Números 18:9-26 e Levítico 5:15-7:35 destacamos:
a) Todas as ofertas que não eram queimadas.
b) Toda coisa consagrada a Deus por voto.
c) Todas as primícias.
d) Todos os primogênitos dos animais.
e) O dízimo dos dízimos dado pelos levitas.
2) Para os levitas (Nm 18:21-32) – Os dízimos de tudo em Israel.
3) Para os pobres destinava-se um segundo dízimo. Dt 12, 14, 26. Sobre esse segundo dízimo falaremos mais adiante. Havia também outras provisões mosaicas destinadas a proteger os desafortunados como a respiga e o ano sabático (Dt 24:19-10; 25:9-10), mas este não é o assunto do presente estudo.
4) Para a construção, reforma e manutenção do Templo.
a) O imposto anual.
b) O dinheiro do resgate das pessoas.
c) Coleta feita pelos sacerdotes.
d) Ofertas voluntárias trazidas ao Templo.
Mesmo respeitando os limites deste trabalho, nos perguntamos como foram administrados os dízimos e ofertas em Israel?
Os exemplos seguintes nos ajudarão a compreender alguns aspectos da questão:
Sob Joás. A reforma de Joás, (cerca de 835 a 796 a.C.) foi uma reforma do Templo e dos seus serviços. Essa empreitada de arrecadação de fundos, para usar uma linguagem bem atual, foi encomendada pelo rei aos sacerdotes. Estes deveriam sair pelas cidades de Judá e levantar dinheiro de todo Israel com o objetivo de reparar “a casa do vosso Deus de ano em ano” (2Cr 24:1-14). Também cobrou ação dos levitas quanto ao “imposto de Moisés” que havia sido instituído para esse fim (v.6). Após haverem conclamado a nação, os levitas receberam esse dinheiro dos israelitas até que a obra foi concluída (vv. 9-10). Esse imposto anual, foi estabelecido no deserto com o objetivo específico de manter e reformar o Templo e correspondia a metade de um siclo “segundo o siclo do santuário” (Êx 30:11-16).
O dicionário diz que o siclo era uma moeda dos judeus, de prata pura e que pesava seis gramas. O shekel ou siclo, era uma moeda de prata pura (meio siclo) que cada um pagava para os gastos de “reparação do Templo e para os sacrifícios, para o perdão do povo. O prazo do pagamento era do dia primeiro ao dia quinze do mês de Adar. Este costume continua até nossos dias,...”
Todo judeu adulto era obrigado a recolher anualmente este imposto e, especificamente nesta época de Joás, estava sendo depositado numa arca de ofertas, no Templo (2Cr 24:8).
Além do imposto do Templo, Joás usou para as despesas da reforma o dinheiro do resgate das pessoas (Lv 27:1-15), as ofertas voluntárias (2Rs 12:4). E a arrecadação feita pelos sacerdotes (2Rs 12:5). Os dízimos continuavam exclusivos para o sacerdócio.
Sob Ezequias. Mentor de uma reforma espiritual que chamava todo o povo para um reavivamento, o rei Ezequias (729 a 686 a.C.) tomou medidas financeiras para restaurar à atividade o Santuário (2Cr 31:2-21). O rei custearia as cerimônias diárias da manhã e da tarde, dos sábados, luas novas e festas fixas, conforme a lei do Senhor (v. 3 e Nm 28:1-29). O povo contribuiria com a parte devida aos sacerdotes e levitas, que eram os dízimos e as ofertas (v. 4-6 e Nm 18) e o fez com tal abundância que foi necessário preparar novos depósitos (v.11), e ali recolher fielmente as ofertas, os dízimos e as coisas consagradas (v. 12).
Havia dois grupos encarregados de administrar as entradas, em separado:
(1) Um intendente e sua equipe para os dízimos e porções dos sacerdotes nominalmente. Recebiam o pagamento apenas os que estavam oficialmente registrados como ministros de Deus (vv. 17-19). Eles não recebiam os dízimos diretamente dos adoradores, mas da tesouraria centralizada que coordenava toda a distribuição das porções dos dízimos e rendas dos que, não tendo outra atividade, viviam somente para o serviço religioso da obra do Senhor (vv. 14, 15 e 19). As porções eram para todos os levitas, sem discriminação.
(2) Outro intendente levita, Coré, e a sua equipe controlava as ofertas e sua distribuição aos que serviam no Templo em seus turnos (vv. 14-16).
A reforma de Ezequias obedeceu às diretrizes que se encontravam nas leis e mandamentos de Deus (v.21). Não eram idéias de organização originais do rei, mas um retorno ao modelo divino abandonado durante a apostasia. Deus as aprovou e abençoou, uma vez que foram declaradas boas, retas e verdadeiras (vv. 20 e 21). Os dízimos continuavam exclusivos para o sacerdócio.
Sob Josias. A reforma posterior, do rei Josias (640 a 609 a.C.), seguiu o mesmo padrão de Joás e Ezequias. As ofertas voluntárias e o imposto do Templo continuavam ainda a serem depositadas na caixa à porta do Santuário (2Rs 22:1-7; 2Cr 24:8-10; 31:14).
Sob Neemias. Depois de recolhidos, em produtos diversos, os dízimos e as ofertas, eram levados a depósitos próprios para cada dádiva, como menciona Neemias (12:44). Esse procedimento chama a atenção, uma vez que tratava-se de uma reforma espiritual que ocorria após o retorno do cativeiro (ca. 444 a.C.). Tal reforma foi seguida de um apelo à devolução das porções prescritas na lei e envolviam ofertas, primícias, dízimos e outras de acordo com a Torah. Tendo determinado depósitos específicos para cada oferta, afim de não misturar entradas que tinham finalidades diferentes, Neemias também elegeu tesoureiros, centralizou a entrega dos recursos no Santuário de onde se distribuíam as porções aos levitas e sacerdotes, cada um em sua função. É sintomática a preferência por um centro recebedor e uma fiel equipe de sacerdotes que fizesse a distribuição “a seus irmãos” ficando uma equipe em Jerusalém para os sacerdotes e outras nas cidades dos levitas (Ne 12:44-47; 13:10-13).
O ministério de Malaquias. Em Malaquias 3:8-10 (ca. 400 a.C.), o profeta refere-se a essa Casa do Tesouro do Templo, com a sua administração e organização, na qual os dízimos não eram misturados com as ofertas e coisas consagradas, mas tinham seu controle por um corpo de levitas nomeado especialmente para receber e dar as porções aos sacerdotes. A ênfase de Malaquias é a falta de bênçãos em virtude de não devolverem os dízimos fielmente, pois deveriam trazê-lo a Jerusalém sob a supervisão dos sacerdotes (dízimo dos dízimos e ofertas especiais) e manter a porção dos levitas em suas cidades para que os tesoureiros, também levitas, fizessem a distribuição conforme fosse necessário.
Segundo McConville, mencionado por E. E Carpenter, já citado acima, Neemias representa a mais antiga tradição acerca do uso do dízimo e deriva de Deuteronômio e Números.
Não podemos esclarecer, evidentemente, todos os detalhes referentes ao uso do dízimo levítico em Israel, mas podemos, com razoável segurança entender que esse dízimo era a décima parte das rendas do adorador, obrigatória, que não podia ser trocada ou resgatada, no todo ou em parte, era consagrada ao ministério, não podendo ser utilizada para nenhuma outra finalidade ou serviço, mesmo do Santuário, e que sua administração não era feita pelos sacerdotes individualmente e nem pelo adorador, mas por uma equipe designada dentre os próprios levitas; além do mais, é dito pertencer a Deus e por isso deve ser devolvida (Lv 27; Ml 3:8-10). Por outro lado, quanto às ofertas, elas pertencem ao homem (Dt 16:10), o critério de quanto dar é do homem (Dt 16:17), podem ser usadas para várias finalidades (Êx 30:12, 13; 2Cr 31:14; 24:6, 9; Ne 10:32), por isso damos. Foi a liberalidade e obediência dos israelitas ao princípio desses usos adequados nas diversas ofertas que possibilitou toda a construção, manutenção e reformas do Templo em várias épocas sem lançar mãos do dízimo, conforme Deus prescrevera.
O Dízimo no Novo Testamento
A palavra dízimo não é usada de forma direta nas instruções à igreja sobre o assunto, no entanto é bom lembrar que a omissão não invalida a doutrina e nem o Novo Testamento se destinava a ser o instrumento único que vai estabelecer as doutrinas válidas da igreja. Uma doutrina não precisa ser repetida nos escritos neotestamentários para ser validada. Aliás, o Antigo Testamento eram as Escrituras usadas pelos apóstolos e na qual respaldavam seus ensinos. Encontramos, porém, no Novo Testamento, o ensino do dízimo abordado de outra forma, nos argumentos em favor de uma visão mais exaltada do ministério cristão e seu direito à justa remuneração. Como o dízimo subsistia, anteriormente, sem a lei levítica, como já foi visto, persevera após ela.
Na epístola aos Hebreus, capítulo sete, menciona-se a exclusividade dos levítas para recolher o dízimo dentro do sistema Mosáico. O autor de Hebreus aproveita a oportunidade para chamar a atenção de que em Abraão (antepassado dos levítas) Levi, havia dado os dízimos para um sacerdócio superior, instituído por Deus. Mequizedeque é representante do sacerdócio de Cristo, superior ao aarônico e levita. Aqui, mais uma vez, o dízimo é mencionado em sua anterioridade ao sistema levítico e é declarada a sua natureza sagrada e exclusiva para o ministério, servindo inclusive, para identificar a importância do ministério não levítico de Mequizedeque, pois que esse recebeu dízimos do próprio Abraão. Embora não seja o propósito direto da passagem em questão, somos levados a pensar, se, os dízimos dados a Mequizedeque, não apontam para o princípio da manutenção sacerdotal que passa por Moisés, chega ao NT e permanece até os dias atuais, lembrando que o atual ministério é uma extensão, na Terra, daquele que está sendo desenvolvido pelo Salvador no Santuário do Céu. Não é o ministério da igreja, por meio dos que “vivem do evangelho”, uma extensão do ministério salvador de Cristo?
O fariseu, estrito cumpridor da Lei, não esquecia de devolver seu dízimo fiel, mesmo que fosse “do endro e do cominho” (Lc 18:12). Embora sua negligência da justiça, misericórdia e fé merecesse a reprovação de Jesus, o Salvador não deixou passar a oportunidade para reiterar o princípio da fidelidade nos dízimos: “fazei estas coisas sem omitir aquelas”. Ou seja, “não use o dízimo para negligenciar a misericórdia, não use a misericórdia para negligenciar o dízimo” (Lc 11:42; Mt 23:23). Uma advertência do próprio Salvador contra a religião unilateral.
Interessante notar que, os fariseus acusavam Jesus de muitas coisas, porém jamais de não ser dizimista ou pregar contra esse sistema. Esse aspecto se torna mais relevante quando é lembrado que o Salvador condenava a avareza dos fariseus (Mt 23:14, 16, 17; Lc 16:14), descritos nos Evangelhos como uma elite cultural e religiosa da época (Mt 23:2). Além disso, suas disputas pelos cargos sacerdotais e as corrupções decorrentes não foram suficientes para impedir de Jesus de fazer o apelo pela lealdade do dízimo: “fazei estas coisas”.
A defesa de Paulo para a remuneração dos ministros do evangelho, tem sua base argumentativa nos textos do AT que se referem às entradas que mantinham os sacerdotes (1Co 9:6-14). Segundo ele:
1) Havia apóstolos que não trabalhavam secularmente (v. 6).
2) Pagar ministros era uma prescrição da lei (v. 8 e 9), e esta o fazia pelo sistema de dízimos (Nm 18).
3) O verso 13, diga-se, é uma referência direta do dízimo. Pois baseia seu apelo para o pagamento de ministros da igreja no direito dos sacerdotes e levitas que tinham seu sustento garantido pelo dízimo, a principal de suas entradas. Afinal não eram os sacerdotes e levitas os únicos que se podiam achegar ao altar e prestar o serviço sagrado no Templo (Nm 18:20-26)?
4) Essa parte, devida aos sacerdotes, é um direito do qual já estavam fazendo uso (vv. 10 e 12).
5) O mesmo sistema deve ser usado para os ministros do evangelho (v. 14).
6) Um direito do qual Paulo abriu mão (1 Co 9:12, 15), entre os coríntios (2Co 11:7), mas por causa da contestação do seu apostolado (2Co 11:5, 6) e para não dar ocasião aos falsos apóstolos (2Co 11:8 a 13), no entanto usou desse direito aceitando salário de outras igrejas (2Co 11:8).
7) Esse é um direito tão natural, segundo o apóstolo, como de alguém que planta uma vinha (1Co 9:7; Dt 20:6) e dela cuida (Pv 27:18).
Além disso, pagar os pastores é justo, especialmente aos que servem na pregação e no ensino (1Tm 5:17-18). Deve ser feito de tal maneira que não desperte ganância (1Pe 5:2). Afinal, o objetivo é que o pastor, pago pela igreja, não se embarace com as coisas desta vida e assim, sirva bem à causa de Deus (2Tm 2:4).
Vê-se pois, que, mesmo antes de Moisés, o sistema de manutenção dos ministros de Deus era basicamente pelo dízimo; assim foi durante a teocracia em Israel para a manutenção dos levitas e sacerdotes do Templo de Jerusalém; foi sancionado por Jesus; a manutenção dos ministros do evangelho foi defendida por Paulo usando a linguagem e as idéias do sacerdócio levítico do AT; e, uma vez que a Bíblia não apresenta nenhum outro sistema, parece lógico concluir que esse é o plano que deve ser usado hoje em dia na igreja. Qualquer outro sistema assume a condição de uma criação meramente humana tentando substituir o plano de Deus.
O Segundo Dízimo
Além do (a) dízimo levítico (Nm 18; Lv 27), as hipóteses de estudiosos defendem ora (b) dois dízimos (um para a adoração em família e os pobres e o outro para os levitas e sacerdotes), ora (c) três dízimos (levitas, pobres e para a família, elevando os donativos dos israelitas a um montante fixo de 30% de suas rendas sem contar as doações especiais já mencionadas neste trabalho).
Há referência também ao dízimo do rei, um sistema de impostos, que não será discutido aqui visto não envolver o tema deste estudo.
As passagens em contraste com Números e Levítico acima mencionadas são Deuteronômio 12:6-18; 14:22-28; 26:12-14. Vejamos:
1) Deuteronômio 12:5-18. Promovendo a adoração em família. A ênfase está no uso de uma décima parte das rendas para a adoração em família. Os servos e o levita estariam presentes como participantes. O lugar mencionado nesta passagem é uma referência ao local onde estivesse o tabernáculo, Templo israelita. O levita não recebia esse dízimo pois era apenas um convidado ao banquete religioso da família.
2) Deuteronômio 14:22-28. Lembrando dos pobres, viúvas e órfãos. Basicamente o mesmo conteúdo da passagem anterior com algumas informações adicionais. O banquete seria realizado a cada terceiro ano, evidentemente dentro do círculo sabático, isto é, ao terceiro e sexto anos. Caso o adorador morasse longe e fosse dificultoso transportá-lo , esse dízimo poderia ser vendido, se fosse de produtos agro-pecuários, e trocado por dinheiro (o que não era permitido fazer com o dízimo dos sacerdotes), e levado ao local do templo e no lugar determinado ele faria a festa. Nos outros anos o banquete deveria ser realizado em casa e a lista de convidados, desta vez, seria aumentada estendendo-se aos pobres, viúvas e órfãos. Mais uma vez é o adorador quem faz uso desse dízimo ao seu bel-prazer e o levita não o recebe, ele é, novamente apenas mais um convidado, como os demais, visto não ter “herança na terra”.
Será visto em seguida alguns comentaristas sobre Dt 14:22-28:
Diz Adam Clark:
Trata-se do segundo dízimo que eles deviam comer, v. 23. Havia um primeiro dízimo que era dado aos levitas do qual pagavam a décima parte aos sacerdotes. Nm 18:24 a 28; Ne 10:37 a 38.
Então, do restante, o proprietário separava um segundo dízimo, que ele comia perante o Senhor no primeiro e no segundo ano; e no terceiro ano era usado para os levitas e os pobres, Dt 14:28 a 29. No quarto e quinto anos ele era comido novamente pelos proprietários, e no sexto era dado aos pobres. O sétimo ano era um Sábado, para a terra, e então todas as coisas eram comuns.
Diz o The New Bible Commentary:
Assim é para ser entendido do segundo dízimo, que parece ser o mesmo dízimo do terceiro ano mencionado logo abaixo, v. 28 e Dt 26:12, o qual pode ser visto acima no capítulo 12:17 (...) deste dízimo é dito ser um ato do povo, Dt 26:12, e os levitas não são mencionados em ambos os lugares como recebedores, mas apenas como participantes juntamente com os proprietários...
Matthew Poole:
Quando Moisés falou estas palavras o princípio do dízimo já era bem aceito em Israel. (...) Para assinalar a sacralidade do todo, um percentual definitivo era colocado de lado e dedicado no Santuário. Este é o chamado ‘segundo dízimo’, em contraste com o dízimo dos produtos dados para manter os levitas (ver Nm 18:26 a 28)...
3) Deuteronômio 26:12-14.
Nesta passagem tem-se a última referência sobre este dízimo especial ou segundo dízimo, sendo que a ênfase recai no seu uso a cada terceiro ano. Mais uma vez o adorador usa e administra este dízimo como quer, sendo o pobre e o levita apenas convidados para a festa. Mais uma vez o levita não o recebe, apenas dele participa.
Pode-se concluir, pois, com razoável segurança, que as três passagens dos capítulos 12, 14 e 26 de Deuteronômio se completam. A conclusão, que pode ser tirada por uma atenta leitura, é claramente compartilhada por Ellen G. White:
A fim de promover a reunião do povo para o serviço religioso, bem como para se fazerem provisões para os pobres, exigia-se um segundo dízimo de todo o lucro. Com relação ao primeiro dízimo, declarou o Senhor: ‘Aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel’. Nm 18:21.
Mas em relação ao segundo ele ordenou: ‘Perante ao Senhor teu Deus, no lugar que escolher para fazer ali habitar o seu nome, comereis os dízimos do teu grão, do teu mosto, e do teu azeite, e o primogênito das tuas vacas e das tuas ovelhas: para que aprendam a temer o Senhor teu Deus todos os dias. Deuteronômio 14:23 e 29; 16:11 a 14. Esse dízimo, ou o seu equivalente em dinheiro, deviam por dois anos trazer ao lugar em que estava estabelecido o Santuário.
Depois de apresentarem uma oferta de agradecimento a Deus, e uma especificada porção ao sacerdote, os ofertantes deviam fazer uso do que restava para uma festa religiosa, da qual deviam participar os levitas, os estrangeiros, os órfãos e as viúvas. Assim tomavam-se providências para as ações de graças e festas, nas solenidades anuais, e o povo era trazido à associação com os sacerdotes e levitas, para que pudessem receber instrução e animação no serviço de Deus.
A cada terceiro ano, entretanto, este segundo dízimo devia ser usado em casa, hospedando os levitas e os pobres, conforme Moisés dissera: ‘Para que comam dentro das tuas portas, e se fartem’. Dt 26:12. Este dízimo proveria um fundo para fins de caridade e hospitalidade.
Apesar de haver comentaristas que defendem a existência de duas legislações: uma para o povo quando vagueava no deserto, em Nm 18, e outra para o povo já estabelecido em Canaã, em Dt 12, 14, e 26, conforme já mencionado anteriormente, a Enciclopédia judaica comunga com o pensamento de um segundo dízimo, com aplicações diferentes, nos termos apresentados, basicamente por Ellen G. White:
Maaser Sheni, heb., 2º. Dízimo. Oitavo tratado (7º em alguns códigos) na ordem mishnaica de Zeraim, contendo cinco capítulos. (...) Trata, principalmente, dos dízimos comidos em Jerusalém (Dt 14:22 a 27) e a maneira de resgatá-los em dinheiro.
Declara ainda:
Maaserot ou Maaser Rishon (em heb., ‘dízimo’ ou ‘1º. dízimo’ (...). Trata do dízimo dado ao levita (Nm. 18:21).
Maaser (dízimo). Uma décima parte da produção. Esta costumava ser separada como oferenda religiosa. Esse costume tem origem antiga, como por exemplo, Abraão dando o dízimo ‘um décimo de tudo’ a Melquizedeque (Gn 14:18 a 20). A lei judaica relaciona vários dízimos obrigatórios. (1) Primeiro dízimo (Nm 18:24) dado aos levitas, depois da separação da terumah (oferenda retirada) para os sacerdotes; no tempo do segundo Templo este dízimo também era dado aos sacerdotes.
A Mishnah em seu tratado Maaserot trata desse dízimo.
(2) Segundo dízimo (Lv 27:30 a 31; Dt 14:22 a 26), isto é um décimo adicional tomado depois do 1º. dízimo. Este era consumido pelo próprio dono em Jerusalém. Usava-se apenas durante os 1º., 2º., 4º., e 5º. ano do ciclo sabático. Os pormenores estão no tratado do Maaser Sheni.
(3) Dízimo dos pobres (Dt 14:28 a 29 e 26:12) dado aos pobres e substituindo o segundo dízimo no 3º. e 6º. ano do ciclo sabático.
(4) Dízimo dos animais (Lv 27:32) escolhidos na contagem feita três vezes no ano e oferecidos em sacrifício pelo dono (Veja tratado Bekhorot). Os levitas tinham que pagar um dízimo que eles próprios recebiam (Núm. 18:26).
O sistema do primeiro dízimo subsiste nas Escrituras como parte do plano divino para a manutenção do ministério. Como já foi visto, tal prática antecede a Moisés e subsistia antes do Santuário e do próprio Israel. Não acontece o mesmo com o segundo dízimo. Ele está intimamente ligado (conforme Dt 12, 14, 26) ao sabático que ocorria de sete em sete anos.
A tabela abaixo é ilustrativa das diferenças entre os diversos dízimos (foram incluídos aqui os impostos reais, chamados de dízimos):
TABELA SUMÁRIA DOS DÍZIMOS
O DÍZIMO DE DEUS | O DÍZIMO DOS POBRES | O DÍZIMO DO REI |
Dado aos sacerdotes e levitas. Nm 18:20-26 e Lv 27:30-31. | Para a família no 1º, 2º, 4º e 5º e para os pobres no 3º e 6º anos do ciclo de sete anos Dt 12, 14 e 26; PP, 565. | Um imposto qualquer a título de dízimo. 1 Sm 8:11 a 17. |
1. Dado somente e totalmente aos levitas. | 1. Levita apenas convidado. | 1. Imposto real. |
2. Armazenado no Templo Ml 3:8-10. | 2. Não armazenado no Templo nem dado ao levita. | 2. Levado ao tesouro do rei. |
3. Não usado pelo adorador. | 3. Era usado pelo adorador. | 3. Usado pelo rei. |
4. Não trocado ou vendido. | 4. Podia ser trocado e vendido. | 4. O rei administrava. |
5. O levita recebia e dizimava. | O levita não dizimava pois não recebia. | 5. O rei devia dizimar. |
6. Visava sustentar os ministros religiosos de Israel. | 6. Visava sustentar os pobres. | 6. Visava sustento do rei. |
7. Manter o serviço ministerial. | 7. Visava festas familiares. | 7. Visava sustento do rei. |
8. Um ato de fé: “fazei prova de mim...” | 8. Ato de caridade. | 8. Ato compulsório. |
9. Pré-Mosáico, sancionado por Jesus. Gn 14:28; Mt 23:23. | 9. Apenas Mosaico, ligado ao Templo. | 9. Monárquico apenas. |
10. Permanece com o pastor, atual ministro do altar. I Cor. 9:13,14 | 10. Findou com o fim dos serviços do Templo. | 10. Findou com o fim da monarquia. |
Conclusão
Nessa questão é preciso lembrar que toda uma comunidade, um verdadeiro exército, deveria ser mantido pelo sistema de dízimo, sob pena de abandono do seu ministério para cuidar da sobrevivência. A dedicação exclusiva era indispensável e precisaria ser mantida com um sistema consistente e esse sistema é o de um dízimo exclusivo para os levitas e sacerdotes, daí a necessidade de um constante reavivamento nessa área. Basta calcular que a condição financeira dos levitas seria, aproximadamente, nesse sistema, a média da situação de todas as demais tribos, sem implicar necessariamente, em enriquecimento.
A idéia do dízimo, como interpretada a partir de Deuteronômio, sendo usada para os levitas, pobres e outros carentes, misturadamente, encontra-se isolada na Escritura, que postula antes e depois, um dízimo exclusivo para os levitas e sacerdotes, e outro para a adoração em família e para os pobres (um segundo dízimo). Além disso, parece que a conseqüência natural dessa interpretação (um único dízimo não exclusivo para os levitas) leva a tribo de Levi ao empobrecimento, deixando-a ao nível dos pobres mendicantes. Também não teria sentido apelar para trazer os “dízimos à casa do Tesouro” (Ml 3:8-10), ao Templo em Jerusalém, com sua tesouraria específica (Ne 12:44), se os dízimos devessem ser usados pelos adoradores, desde a época deuteronômica, como querem alguns. Como explicar o conflito em Números 18 versus Deuteronômio 12, 14 e 26? As soluções, de qualquer modo, frente à história posterior de Israel, resultam na final permanência de um único dízimo exclusivo para os sacerdotes. Como dizer que deveriam os levitas receber da tesouraria do Templo, os dízimos arrecadados das cidades, conforme a lei prescrevia (2Cr 31:2-21)? Então, não eram entregues diretamente aos levitas e nem usados pelo adorador. Se já houvessem (os levítas) recebido diretamente do adorador, ou se estes os usasse como bem quisesse, para que, então, tesouraria de dízimos no Templo? Ou o pensamento deuteronômico trata de um segundo dízimo, conforme vimos, ou então, esta é uma questão irreconciliável, perdida no mundo das hipóteses.
Conclui-se, portanto, pela idéia de que na Bíblia aparecem dois dízimos diferentes e separados. Um destinado, anteriormente, aos levitas e sacerdotes e, hoje, ao pagamento de ministros do evangelho, e o outro destinado à adoração em família e atendimento aos necessitados. Este segundo dízimo, entre outras doações do sistema mosaico, apresenta-se como um referencial básico para as ofertas que, segundo Paulo, devem ser dadas “não com tristeza nem por necessidade” mas com “alegria” (2Co 9:6 a 12), lembrando a alegria que, segundo Deuteronômio deveria acompanhar a sua entrega (Dt 12:6, 7, 12, 18; 14:26; 26:14), a qual, enfatiza, não deveria ser feita com “tristeza” (Dt 26:14).
Um reavivamento e retorno ao modelo bíblico de liberalidade e administração fiel do fundo sagrado, seja por parte de nossas instituições ou individualmente, mediante a instrução pastoral, ainda se faz necessário em nossos dias como o foi, algumas vezes, no passado.
Num mundo onde a corrida pelo dinheiro tomou o lugar do amor a Deus e à sua obra no coração de muitos professos cristãos, certamente, esse exemplo, dos fiéis israelitas às determinações divinas, é uma lição de liberalidade, nos dízimos e nas ofertas, digna de ser imitada hoje pelos verdadeiros adoradores, que amam mais a Deus do que a Mamom, e querem preparar o mundo para a breve volta do Senhor Jesus.
Demóstenes Neves da Silva
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