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Origens da Inquisição



“Durante o século XIII, com o objetivo de erradicar a heresia crescente na Europa, o Papa Gregório IX decide anunciar o estabelecimento de um tribunal permanente, assim a Inquisição foi oficialmente inaugurada como instituição. O centro da difusão de bases teóricas que explicassem a heresia como fenômeno patológico estava por ser iniciado. A partir deste momento o corpo, a alma, os sentimentos e a sensibilidade seriam a essência do espírito, e definiria assim a constituição dos hereges e os não hereges.

JOFFILY (1993, p. 19) nos diz que “[...] para compreender o processo histórico da Inquisição é preciso situá-lo na certeza de que o ser humano vivia polarizado entre anjos e capetas, entre a virtude e o pecado, e que sua alma alcançaria o céu ou seria lançada ao inferno passando (ou não) pelo purgatório”.

A evolução de seitas contrárias à religião católica é crescente e plural, os heréticos passam a ser perseguidos como inimigos do Estado. A Inquisição estava disposta a colocar fim a nova crise na cristandade, “os pecados mortais” e suas remissões eram discutidos pela Igreja e pelo Tribunal da Santa Inquisição, a fim de arrolar princípios para compor os julgamentos considerados hereges, de maneira que as penas fossem graduadas de acordo com o crime cometido.

Segundo BAIGENT e LEIGH (2001, p. 39):

[...] em virtude do édito do Papa, Inquisidores dominicanos receberam autoridade papal para prender suspeitos de heresia sem qualquer possibilidade de apelação – e assim, com efeito, pronunciar sumárias sentenças de morte. A queima de hereges não era, claro, novidade [...] com a benção do Papa, estabelecia-se a maquinaria de extermínio em massa numa base legal, oficial, com uma sanção e mandado formais derivados diretamente da mais alta cristandade.

Com toda esta autoridade devida ao Papa, o aparato administrativo que estabelecia o Tribunal Inquisitorial, estava diretamente ligado a ala nobre da cristandade. Com isso, não surpreende, que ocorresse uma confusão de autoridade entre os bispos e os nomeados Inquisidores, pois estes estavam investidos de autoridade papal, retirando dessa maneira parte da jurisdição eclesiástica oferecida aos bispos. Por sua vez, os bispos agiam impondo uma versão implacável de comandantes militares legalmente constituídos e derivados da mais alta autoridade da cristandade.

O antagonismo ideológico existente entre bispos e Inquisidores acompanhado de estreitos pontos de vista, percorreu o século XIII, assim o poder episcopal estava sendo absorvido pelas idéias inquisitoriais que tinham respaldo legal, para por regras ao duelo ideológico existente. Foi criada no ano de 1273 a distribuição dos poderes entre os bispos e os Inquisidores, as técnicas da Inquisição pareciam destinadas e acordadas entre Igreja e Inquisidores, o poder estava dividido segundo a maquinaria formal, o processo de investigação, o julgamento, a tortura e a execução.

Conforme BAIGENT e LEIGH (2001, p. 40)

Em 1273, o Papa Gregório X pôde ordenar que os Inquisidores atuassem em conjunto com os bispos locais, dividindo autoridade e jurisdição; e essa iria aos poucos tornar – se a norma daí por diante. Para a primeira geração dos Inquisidores, a vida nem sempre foi fácil. Ás vezes oferecia ampla oportunidade de exaltar – se num senso de tribulação, e de glorificar-se de acordo.

Seguindo o pensamento proposto pelos estudiosos da Santa Inquisição, trabalhando em conjunto, Inquisidores e bispos, dividiam o mesmo raciocínio quanto aos hereges, embora a intenção de ambos fosse evitar ao máximo o derramamento de sangue, o que simbolizava a organização de imagens positivas a estrutura contraposta ao movimento daqueles que eram contrários aos dogmas católicos. Condenar sem efusão de sangue seria a prática desenvolvida pelo Tribunal do Santo Oficio como a mais comum, já que ser queimado na fogueira (Auto-de-fé) era simbolicamente considerado como “relaxamento em carne”.

ANDRADE (2006, p. 11), analisando este período histórico diz que,

[...] a inexistência de um regramento único e uniforme que disciplinasse essa perseguição religiosa permitiu a prática de desvios e abusos por parte dos Inquisidores, atuando como um importante fator que só fez aumentar a proliferação de seitas religiosas diversas do cristianismo. Foi em razão deste fenômeno que começaram a surgir instrumentos que se destinavam a auxiliar os inquisidores não só a identificar os hereges e suas práticas, mas também a orienta-los na formação e trâmite de seus processos criminais.

A maioria das formas de tortura utilizada pela Inquisição evitou o derramamento de sangue. As formas utilizadas pelos Inquisidores para conter o sangue foram basicamente: as torturas na água, saca-unhas, e o ecúleo, idealizados para causar dor, evitando assim o “correr sangue” e minimizando a quantidade de sujeira. Contudo, o “símbolo” da Inquisição foi o elemento fogo, acreditava-se que ao queimar um herege algo supremo aconteceria.

Segundo BAIGENT e LEIGH (2001, p. 47) “a queima de um herege tornou-se ocasião de comemoração, um acontecimento alegre.”. De acordo com o pensamento dos autores, o homem teria a verdadeira importância como animal simbólico, pois a partir da representação humana no mundo estariam envolvidas, entrelaçadas diversas emoções, sentimentos e maneiras de encontrar-se e compreender-se. Assim, o sacrifício humano como ritual foi sendo remodelado através da piedade cristã.

BAIGENT e LEIGH (2001, p. 54) narraram como ocorriam os rituais do auto-de-fé:

Para assegurar o número máximo de espectadores, as execuções, sempre que possível, realizavam-se em feriados públicos. O acusado era amarrado a um poste acima de uma pira de lenha seca, alto o bastante para ser visto pela multidão reunida. Mais tarde, na Espanha, as vitimas eram às vezes estranguladas antes de acenderem a pira, sendo assim misericordiosamente poupadas da agonia das chamas.

Nos autos-de-fé da Santa Inquisição a presença do elemento fogo seria o agente purificador, elemento que provocaria o máximo de dor e o mínimo de sujeira, por isso, adotado de forma implacável pela Santa Inquisição. O motivo da queda do ser humano e de sua salvação seria particularmente nítido para a sociedade.

Na Península Ibérica, a Inquisição se instalou primeiro no ano de 1238, apenas em Aragão. Em outros domínios espanhóis, como foi o caso de Castela, até o ano de 1376, a Inquisição foi inoperante. No século XV, com a intenção de unificar o reino espanhol (Castela e Aragão) não apenas territorialmente, Fernando e Isabel, representantes do reino, decidiram que também deveria ocorrer a unificação de todos os assuntos religiosos, e assim foi colocada em solo espanhol a expulsão de todos aqueles considerados “impuros”, islâmicos, judeus, hereges. Com esta proposta em mente, foi estabelecida em novembro de 1478, através da bula pala de Sisto IV a criação da Inquisição em solo espanhol.

A Inquisição espanhola emulou as de outras partes. Ao contrário destas, porém, a espanhola não era instrumento do papado. Prestava contas a Fernando e Isabel. Como os domínios dos monarcas espanhóis compreendiam uma espécie de teocracia, com a Igreja e o Estado atuando conjugados, a Inquisição espanhola era tanto um adjunto da Coroa quanto da Igreja.

Inquisição no reino espanhol assim se fez travestida de instrumento de política real. O objetivo principal desenvolvido na criação da Santa Inquisição e sua forma conjunta com a política desenvolvida pelos reis espanhóis como afirma os autores na passagem acima citada, estava concentrado em promover a retirada dos judeus e de todos aqueles não convertidos ao catolicismo de seu território. A ideia desenvolvida entre os reis católicos em conjunto com a Igreja, foi aceita pela Bula Papal de 1483, e assim, encontramos a perfeita demonstração da interferência religiosa nas questões estatais, a ideia de pecado e descumprimento das leis do soberano, estavam lado a lado. E dessa forma ocorreu a dispersão dos judeus da Espanha para Portugal ao longo do século XV, mais precisamente no ano de 1492. Em solo português, a Inquisição também era comandada por um rei que centralizava, fortificava e solidificava seu poder, o alvo em Portugal assim como na Espanha, foram os cristãos-novos, recém convertidos à fé cristã, que os inquisidores julgavam manter seus ritos judaicos secretamente, as tensões cotidianas começaram a surgir.

A Inquisição espanhola e seu caráter anti-semita contribuíram por formar em terras portuguesas o caráter do sentimento popular para o movimento inquisitorial, perseguir, expulsar, exterminar o diferente, o herege. Ocorria desta forma a formação de estabelecer o diferente como inimigo, deter seu crescimento seria então a melhor forma. Assim, a expulsão ou extermínio de judeus no território da Península Ibérica foi algo constante, seja na Espanha ou em Portugal, o que reforçou novos fluxos migratórios, inclusive para o “Novo Mundo”.

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Fonte:
MIRELLA DE ALMEIDA F. GUERRA: "BRANCA DIAS: A FÉ DA INTOLERÂNCIA E A INTOLERÂNCIA DA FÉ". (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba, como requisito à obtenção do titulo de Mestre em Ciências das Religiões, na linha de pesquisa Religião, Cultura e Produções Simbólicas, sob a orientação do professor Doutor João Azevedo Fernandes). João Pessoa - PB, 2009.

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
Eduardo
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